O Parecer CFM n° 54/2003 reforça o entendimento de que os programas de saúde pública devem observar a necessária diferenciação entre as atribuições de cada profissional da equipe de saúde, de acordo com a capacitação e a legislação que regula cada profissão. O motivo da consulta foi a preocupação de que as ações de médicos e enfermeiros que participam do Programa de Educação Permanente em Hipertensão e Diabetes não estivessem claramente diferenciadas, comprometendo, assim, a exclusividade e integridade dos atos médicos, notadamente quanto aos diagnósticos das enfermidades e as indicações terapêuticas. O conselheiro Luiz Nódgi foi o responsável por emitir o parecer à Secretaria de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde. Leia a íntegra do documento, onde, mais uma vez, é reforçado o conceito de que diagnóstico e tratamento de doenças devem ser atribuições exclusivas do médico: “O Secretário de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde encaminha o que chama de Proposta de Educação Permanente em Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus, baseada na constatação de que se trata de doenças freqüentes na população brasileira, responsáveis por alta morbimortalidade e de tratamento relativamente eficaz, na atualidade, em associação com a possibilidade de atuar favoravelmente no material humano que lida com tais problemas de saúde, no sentido de mais bem capacitá-lo a obter melhor resultado a longo prazo. O desenho do projeto parece-me bastante satisfatório e há compromisso para financiamento, com a vantagem de aliar todos os níveis governamentais de atenção à saúde. A proposta é bem interessante, principalmente pelo fato de que as doenças em questão freqüentemente são diagnosticadas por clínicos gerais ou médicos não-especialistas, daí advindo a adoção de orientações as mais diversas, quase sempre em desacordo com o que deve ser praticado, o que significa prejuízo para os pacientes, além de gastos desnecessários. Tenho a ressaltar que nossa manifestação talvez seja tardia, em virtude do tempo decorrido. É mesmo possível que o projeto tenha abandonado o papel e se transformado em realidade. Aliás, em governo passado, tivemos a oportunidade de oferecer nossa contribuição em programa semelhante de hipertensão arterial, talvez não tão abrangente, mas que não prosperou. Ademais, a correspondência do Ministério da Saúde não se reporta claramente a uma apreciação por parte do CFM, muito embora se deva salientar que a idéia seja vantajosa e de enorme alcance, meritória e digna de ser reproduzida em outros tipos de patologia do cotidiano, por ser eminentemente ética em sua formulação. Por uma questão de dever, como conselheiro, devo, porém, assinalar que o papel do enfermeiro não ficou transparente no programa. Acreditamos que sua participação seja relevante, até imprescindível, considerando as condições do país, mas é de todo importante que as ações de cada profissional engajado sejam bem definidas, não só para o benefício dos pacientes, mas também com vistas ao respeito exigido pelas limitações legais e de formação acadêmica. Após cuidadosa análise do processo em tela, incluindo a avaliação da “Proposta de Educação Permanente em Hipertensão Arterial e Diabetes” encaminhada a este CFM pela Secretaria de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde, proponho a aprovação do parecer com os seguintes acréscimos: O projeto tem como objetivos: Objetivo geral: Implementar um processo de educação permanente em Hipertensão Arterial e Diabetes mellitus para os profissionais da rede básica de saúde do SUS, nos municípios com população acima de 100 mil habitantes, visando capacitar esses profissionais na prevenção, diagnóstico, tratamento e controle desses agravos. Objetivos específicos: – – Disponibilizar a todos os profissionais da rede básica de saúde dos municípios com população acima de 100 mil habitantes instrumentos que possibilitem o acesso à educação permanente em HA e DM, favorecendo a adoção de uma prática profissional mais eficaz e resoutiva no âmbito da promoção da saúde, prevenção de complicações, diagnóstico, tratamento e controle da HA e do DM; – – Mobilizar os profissionais da rede básica de saúde para o desenvolvimento de ações que visem à reorganização dos serviços públicos relativos à HA e ao DM, prestados nesse nível de assistência; – – Estimular o estabelecimento de uma cultura institucional entre os profissionais da rede básica de saúde, orientada na busca por ampliação dos campos de conhecimento e por aprimoramento profissional de forma autônoma, de maneira que o acesso à informação e à educação a distância reflita na sua prática profissional. Sua estratégia de especialização preconiza: O Projeto de Educação Permanente compreende duas etapas operacionais: a primeira refere-se ao momento presencial e a segunda ao momento de educação a distância. A etapa presencial prevê a realização de uma Oficina de Atualização em HA e DM, com oito horas de duração, sendo quatro para cada agravo, para médicos e enfermeiros das unidades básicas de saúde (UBS) dos municípios envolvidos no Projeto (um médico e um enfermeiro por UBS). Esses profissionais deverão funcionar como agentes multiplicadores dos conteúdos discutidos nas Oficinas de Atualização, retransmitindo o conhecimento adquirido para os seus colegas de trabalho. No entanto, no tópico sobre Responsabilidades Institucionais, nas atribuições das Secretarias Municipais de Saúde Partícipes do Projeto, temos o seguinte texto: Mobilizar, incentivar e criar condições favoráveis para que os profissionais que participaram das Oficinas de Atualização possam envolver os demais profissionais das UBS, desencadeando um movimento de valorização de ações referentes à promoção da saúde, prevenção de doenças associadas à HA e DM, assim como aprimorar a capacidade de detecção, de diagnóstico, de tratamento, de controle e de acompanhamento desses agravos. Ora, diagnóstico e tratamento são atribuições exclusivas do profissional médico. Não fica claro, no texto, a devida diferenciação de atribuições entre o médico e o enfermeiro, o que pode suscitar interpretações e ações equivocadas por parte dos responsáveis pelas UBS. Recomendamos, portanto, que as devidas correções sejam adotadas pela Secretaria de Políticas de Saúde do Ministério, permitindo, então, a viabilização do projeto que certamente será um avanço no atendimento de nossa população.”
Parecer do CFM reforça: diagnóstico e tratamento de doenças são atribuições exclusivas do médico
13/02/2004 | 02:00