Em audiência pública promovida pelas Comissões de Educação e de Ciência e Tecnologia do Senado sobre os desafios do ensino médico no Brasil, o conselheiro federal Donizetti Giamberardino criticou o crescimento desordenado de faculdades de medicina no País, cobrou critérios mais rigorosos por parte do Estado para qualificar o aprendizado dos estudantes e falou que falta ao Brasil uma política consistente de fixação de profissionais de saúde em municípios de difícil provimento.
A audiência foi solicitada pelo senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) e contou com a participação de representantes dos Ministérios da Educação e da Saúde, de entidades médicas, como o CFM e a Associação Médica Brasileira (AMB), assim como de professores de grandes universidades públicas.
Interesse público – Para o integrante do CFM, o ensino médico deve ser tratado como uma área de interesse público e a concessão de sua atividade necessita de regulação. “Não se trata de uma área de atividade comercial e iniciativa liberal. Da formação do médico se espera um indivíduo crítico, reflexivo e humanista que deve adquirir conhecimento e habilidades específicas durante o curso. O médico mau formado é um risco à sociedade e ao financiamento da saúde e afeta a confiança da sociedade no profissional. Nem o país mais liberal do mundo, os EUA, aceita abrir escolas por livre opção comercial”, ressaltou.
Ele lembrou que, desde 2010, mais de 200 escolas médicas foram criadas no Brasil, número superior ao total de escolas abertas entre 1808 e 2010 (180). Segundo Giamberardino, quase 80% das faculdades de medicina do País não respeitam critérios mínimos para a formação adequada dos alunos e boa parte delas não dispõe de corpo técnico qualificado para transmitir o aprendizado.
Critérios – “Não existe medicina sem médico e medicina sem paciente. Acreditamos que um município que sedia uma escola médica tem de apresentar, no mínimo, cinco leitos públicos para cada aluno no município; no máximo, três alunos para cada equipe de saúde da família; e pelo menos um hospital ensino ou unidade hospitalar com potencial para hospital de ensino. E não é isso que vemos: 78% dessas cidades não dispõem de algum desses critérios”, observou.
O conselheiro avalia que é preciso conscientização: escolas médicas devem ser criadas com base em necessidades sociais. “Temos que regular a distribuição de médicos com políticas de Estado e não de governo. Não faltam médicos no Brasil, como podemos ver pela média por mil habitantes da OCDE. Falta política pública de fixação, com carreiras estruturadas”, disse.
SAEME – Donizetti Giamberardino é o coordenador do Sistema de Acreditação de Escolas Médicas (SAEME-CFM), que funciona conferindo excelência aos critérios metodológicos, pedagógicos e técnicos às instituições de ensino médico. No total, 97 cursos no País passaram por esse modelo de avaliação. Ele acredita que o ideal seria implementar o SAEME em todo o País.
Segundo ele, já foi proposto a criação de um grupo de trabalho, com a participação de representantes dos Ministérios da Educação (MEC) e da Saúde e das entidades médicas, para discutir uma forma de implementar essa ação. “Assim, poderíamos definir parâmetros para regulamentação de abertura e aumento de vagas em cursos de medicina, contemplando o fluxo, os procedimentos e o padrão decisório dos atos de autorização, reconhecimento e renovação para o seu reconhecimento, bem como seus aditamentos. Precisamos de critérios técnicos e não políticos financeiros. Critérios claros do MEC para evitar liminares”, sublinhou.
Na audiência, o conselheiro ainda defendeu a implementação de avaliações periódicas aos alunos de medicina. Há um projeto de lei (PL 785/2024), de autoria do deputado Doutor Luizinho (PP-RJ), que institui o Exame Nacional de Proficiência em Medicina, a ser regulamentado em provimento do CFM, como requisito para o registro de médicos nos Conselhos Regionais de Medicina e para o exercício da profissão médica.