Expressão vergonhosa da forma como a mulher pobre é tratada no Brasil, a mortalidade materna volta a ser prioridade de governo. O próprio presidente Lula viveu a dor de perder a primeira esposa, aos 22 anos, vítima da “tragédia evitável”. No 15º Congresso Baiano de Ginecologia e Obstetrícia, a atual coordenadora da Área Técnica de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde, Maria José Araújo, falou sobre o tema em entrevista ao Jornal do Cremeb. Ex-dirigente da Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos, médica com título de especialista em Pediatria, ela diz que o “segredo” para se combater a morte materna é a continuidade, caminho trilhado com sucesso por países pequenos como Chile, Cuba e Costa Rica. Não há índices fiéis do problema no Brasil, mas segundo pesquisa encomendada pelo Ministério da Saúde ao professor Rui Laurenti, da Faculdade de Saúde Pública da USP, e aplicada nas capitais e no distrito federal, encontrou-se uma relação de morte materna de 74.6 mulheres que morrem por 100 mil crianças nascidas vivas. É um número alto para os parâmetros da Organização Panamericana de Saúde (OPAS). E o pior: de acordo com Maria José, a subnotificação chega a 50%. Desde maio, o Ministério da Saúde tornou compulsória a notificação de morte materna. P – Dra. Maria José, gostaria que falasse da Área Técnica que coordena no Ministério da Saúde e quais as suas atribuições. R – A área técnica tem uma função, sobretudo, de propor políticas em nível nacional para o Ministério, elaborar normas técnicas, condutas clínicas consensuadas, realizar capacitações em parceria com a Secretaria de Gestão do Trabalho, levantando as necessidades conceituais, indicando nomes de pessoas, assessorar tecnicamente os estados e municípios, especialmente os mais débeis. O ministro Humberto Costa tem dito publicamente que a saúde da mulher é uma das prioridades do Ministério da Saúde, e a proposta é trabalhar em parceria com todos os departamentos que possuem interfaces. P – Dentro da saúde da mulher, que espaço terá a mortalidade materna? R – Primeiramente, acho que a mortalidade materna deve ser vista como uma violação grave dos direitos humanos das mulheres, sobretudo porque no Brasil e nos países em desenvolvimento quase 96% das mortes são evitáveis, com medidas simples e baratas. Segundo: não dá para aceitar que no século XXI uma mulher morra de mortalidade materna. E terceiro: trabalhar com a mortalidade materna não significa só trabalhar com a questão da gravidez e do parto, dentro de um conceito antigo materno-infantil, mas com a saúde sexual e reprodutiva, um conceito que vem sendo adotado desde as conferências do Cairo e de Pequim. Significa trabalhar com planejamento familiar, direito ao aborto nos casos previstos em lei, infertilidade, parto humanizado, pré-natal decente, saúde mental das mulheres. P – O ministro Humberto Costa disse que a meta é diminuir os índices atuais no Brasil para 25%. Como se pretende fazer isto? R – É uma meta ambiciosa. Na Conferência de Maternidade Segura, feita pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em Nairobi, no final dos anos 80, e na Conferência do Cairo, em 94, a proposta era reduzir a morte materna até 2000 em 50%, mas não se conseguiu. Na minha opinião não foi possível por falta de investimento, de prioridade, já que as causas de morte materna nos países do Terceiro Mundo estão ligadas às causas diretas, que são quatro: a hipertensão, as hemorragias, as infecções puerperais e os abortos. Todas são evitáveis com medidas de prevenção e promoção da saúde, tratamentos corretos, práticas baseadas em evidências clínicas. Já se sabe, por exemplo, que o corte vaginal na hora do parto não é mais necessário na grande maioria das mulheres. Bem como a cesárea desnecessária, o parto na horizontal, que é antifisiológico, a não presença de familiares ou amigos na sala de parto. E que os médicos continuam fazendo, ou por desconhecimento ou negligência com as mulheres. Sou médica e posso dizer que existe uma ética diferente dos médicos nos consultórios privados e nos serviços públicos. P – Qual seria a prioridade, então, neste momento? R – Acho que são duas: uma seria melhorar a qualidade do pré-natal, que é muito ruim nesse país. A outra, investir nos cuidados obstétricos essenciais, as medidas de emergência, algumas extremamente simples. Já está provado que o sulfato de magnésio bem aplicado numa mulher com eclâmpsia reduz e dá o tempo suficiente para que ela chegue ao hospital. Mas ainda se usam os diazepínicos. A Organização Panamericana de Saúde (OPAS) disse que para cada 500 mil habitantes tem que ter quatro centros de atendimento às mulheres de cuidados básicos e um de cuidados essenciais e integrais. A participação ndos estados e municípios é fundamental. Não adianta o Ministério repassar dinheiro, ter boas propostas, se não houver integração, responsabilidade e aderência dos municípios. O programa do parto humanizado está provando isso. O Ministério repassa R$ 90 para o município, relativo a cada gestante que completou o ciclo (teve o pré-natal qualificado, o parto e uma consulta de puerpério), e mesmo com esse incentivo os indicadores continuam horríveis. P – Qual o perfil das mulheres vítimas de mortalidade materna? R – Os dados dizem que as mulheres que morrem de mortalidade materna são as mulheres pobres desse país, as excluídas do sistema social, que não têm acesso aos serviços, não têm dinheiro para pagar um táxi até o hospital, e que não têm poder para reivindicar do sistema de saúde melhorias no atendimento. Uma mulher que, no pré-natal, vai ao serviço de saúde, e o médico não tira a sua pressão arterial, tem que exigir dele, denunciar o caso ao Ministério Público.

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