A possibilidade de um médico não especialista atender pacientes em áreas de alta complexidade gerou grande debate entre os participantes do I Encontro Nacional dos Conselhos de Medicina do ano de 2015, em Belo Horizonte. A mesa “Exercício da especialidade de alta complexidade”, foi coordenada pelos 1º e 2º vice-presidentes do Conselho Federal de Medicina (CFM), Mauro Ribeiro e Jecé Freitas Brandão, respectivamente. A discussão ocorreu na sexta-feira (6).
Conforme o artigo 17 da Lei 3268/57, o médico pode atuar em qualquer área, sem a necessidade de título de especialista, bastando para isso ter o seu CRM válido. Segundo a legislação, qualquer médico formado, com seu título registrado no Ministério da Educação (MEC) e inscrito no Conselho Regional de Medicina (CRM) de sua jurisdição pode livremente exercer atividades em qualquer área da Medicina.
Em sua exposição, o assessor do Conselho Federal de Medicina (CFM), Roberto Luiz d’Avila, destacou as mudanças de realidade desde a promulgação da Lei 3268 até a atualidade. “O mundo mudou. Em 1957, éramos pouco mais de 10 mil médicos no país e hoje já alcançamos um total de 400 mil. Precisamos atualizar nossas condutas pela segurança da população. Não pode-se ignorar a evolução natural da medicina, que ao longo dos anos foi se tornando cada vez mais complexa”, disse.
O desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná, Miguel kfouri Neto, reiterou o entendimento. Para ele, quem diz que precisa de maior complexidade é a medicina e não o Direito. “O juiz ao avaliar a conduta do médico verificará a urgência e também sua competência”. O desembargador explicou que os magistrados observam se o profissional tem – ou não – formação e se estava preparado para atuar. “Quanto maior a complexidade é bem maior a exigência dessa formação especifica”, ressaltou.
Especialidades – Na defesa de uma mudança para as especialidades de alta complexidade, o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), Denis Calazans Loma, citou que a lei que criou o CFM e permite a atuação de não especialistas em todas as áreas precisa ser revista com urgência. Segundo observou, essa legislação “não condiz com a realidade da medicina brasileira. O que temos assistido é uma intrusão de médicos de outras áreas com o simples interesse de obter ganhos financeiros”,
O representante da SBCP destacou ainda que a presença de profissionais não especializados atuando na área coloca em risco a credibilidade de toda a classe. “A cirurgia plástica vive uma situação de risco por causa da entrada desses médicos sem capacitação”. Ele relatou que, inclusive, há problemas e perigos de cursos que têm sido oferecidos, inclusive de um dia. “Cada vez um número maior de sequelas é causado por conta da falta de especialização e de capacidade para aquela prática”.
O tema considerado de relevância para o exercício ético e técnico adequado da medicina continuará a ser avaliado no âmbito das diferentes entidades médicas. Apenas após essa análise aprofundada, encaminhamentos poderão ser adotados.
Ações Sociais – As atividades do terceiro dia do I ENCM 2015 incluíram também, pela manhã, uma explanação sobre o projeto de apoio ao resgate das crianças desaparecidas feita pelo membro da Comissão de Ações Sociais do CFM, Ricardo Paiva. Ele, que também é integrante do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco, destacou o número de 250 mil crianças que estariam desaparecidas no país e ressaltou o compromisso de todos com a questão.
“Saber sobre isso e calar, não é omissão. É conivência diante de quem não tem como se defender. É cumplicidade. Nós médicos podemos e devemos fazer muito para mudar essa realidade”, afirmou, antes de anunciar uma programação nacional prevista para ocorrer em função desta temática.
O CFM, com o apoio dos Conselhos Regionais de Medicina (CRM), pretende reforçar a divulgação de uma série de recomendações para o reconhecimento de crianças e adolescentes desaparecidos. Essa atividade quer atingir os médicos e a sociedade. No caso dos profissionais, estima-se que muitos deles, em algum momento, podem ser colocados diante de uma criança desaparecida em seus consultórios ou outros locais de trabalho. O trabalho acontecerá em 25 de maio, no Dia Internacional das Crianças Desaparecidas.
“Somente quando for motivo de conversas e discussões entre todos, se transforma em opinião pública e esta tem poder de pressão e mudanças sobre os poderes instituídos e teremos transformação social”, defendeu Paiva.