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“ Alguns autores afirmam que a ética na pesquisa em seres humanos é diferente da ética na prática clínica. As obrigações do médico com seu paciente seriam diferentes daquelas do pesquisador com o sujeito da pesquisa. Contudo, não se deve esquecer que o pesquisador é o médico do paciente (sujeito da pesquisa) na maioria das vezes e, como tal, deve proteger o sujeito enquanto paciente”. A declaração é do Professor Emérito (Cirurgia e Bioética) da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, Professor “Honoris Causa” da Universidade de Brasília e Presidente da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa – CONEP/MS, William Saad Hossne. O Brasil conta hoje com cerca de 400 comitês de Ética em Pesquisa (CEP´s) institucionais, já registrados e mais 121 em tramitação, voltados para a proteção dos direitos dos sujeitos da pesquisa; são cerca de 4.200 pessoas, de diferentes formações que se reúnem, pelo menos uma vez por mês, para analisar projetos de pesquisa envolvendo seres humanos. Coordenando o conjunto existe a Comissão Nacional de Ética de Pesquisa (CONEP) que atua como instância normativa, de recurso e de coordenação. A CONEP tem 13 membros, atuando em diferentes áreas, de modo transdisciplinar; necessariamente há um representante de usuário (sujeitos da pesquisa). Cabe à CONEP a aprovação final, após manifestação do CEP, dos projetos das áreas temáticas: genética humana, reprodução humana, pesquisa em povos indígenas, pesquisa com cooperação estrangeira, pesquisas que envolvem biosegurança, pesquisas com novos equipamentos e pesquisas com procedimentos – cuja aceitação ainda não está consagrada na literatura. A CONEP também é responsável pela elaboração de normas complementares, específicas (Resolução 251/97; 292/99; 303/2000; 304/2000) bem como a formação de um Banco de Dados sobre todos os projetos desenvolvidos no país. O sistema CONEP–CEP é interarticulado e harmônico. Os eventos adversos são imediatamente comunicados ao CEP e, em seguida, à CONEP, para análise em interface com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária. O PORTAL MÉDICO conversou com Saad sobre ética na pesquisa em seres humanos e sobre a atuação da CONEP e dos CEP´s no país. PORTAL MÉDICO- Recentemente, o Conselho Federal de Medicina recebeu uma correspondência da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, CONEP, que fazia menção ao caso “Estudo em Glaucoma ( Lumigan Early Experience 2002)”. De acordo com os documentos que nos foram encaminhados, a Allergan Produtos Farmacêuticos recomendava aos oftalmologistas o uso do medicamento Lumigan, um colírio destinado a reduzir a pressão intra-ocular em pacientes portadores de glaucoma de ângulo aberto ou hipertensão ocular. O laboratório também oferecia a R$ 100,00 ao médico que encaminhasse a Allergan uma ficha clínica de acompanhamento do paciente que fosse tratado com o medicamento. Cada médico poderia encaminhar até 10 formulários de pacientes, ” devidamente preenchidos “. Os mesmos documentos também foram analisados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. A que conclusões a Comissão chegou sobre este caso? Os médicos que aceitaram participar desta ” pesquisa” podem ser punidos? E qual a punição prevista para o laboratório que propôs este “experimento”? WILLIAM HOSSNE- A CONEP recebeu o comunicado sobre o ocorrido. De acordo com suas atribuições, a CONEP procurou apurar os fatos, inclusive buscando esclarecimentos junto ao laboratório citado. Após análise dos elementos coligidos, a CONEP encaminhou o expediente ao Conselho Federal de Medicina, por entender que se trata de situação irregular sob esfera de atuação do Conselho Federal de Medicina; o fato foi também comunicado a ANVISA, para as providências cabíveis. Foi dada ciência dos fatos ao Laboratório. As Diretrizes contidas na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde têm forte componente de controle social, concretizado desde sua gênese, passando pela conceituação e operacionalização. Esse é um dos aspectos, digamos pioneiro, da Resolução, no cenário mundial. Assim, à CONEP cabe análise e deliberação, após a devida apuração, quanto aos aspectos éticos e o devido encaminhamento às instâncias e ou órgãos que têm competência para aplicar penalidades ao pesquisador. As eventuais transgressões são também passíveis de apuração e investigação por parte do Ministério Público e dos Conselhos Profissionais. O pesquisador, assim, pode sofrer penalidades aplicadas pelo Conselho de Ética e ou pela Justiça. PORTAL MÉDICO- Como está estruturado no Brasil o sistema de diretrizes e normas regulamentadoras das experiências científicas que envolvem seres humanos? WILLIAM HOSSNE- O Brasil conta, hoje, com diretrizes éticas nas pesquisas envolvendo seres humanos, consideradas modelarares, consubstanciadas na Resolução CNS/MS 196/96. A Resolução foi elaborada após ampla consulta a diversos segmentos da sociedade. É uma peça de natureza bioética, por excelência, na medida em que é pluralista, abrangente, de natureza não cartorial. De acordo com as Diretrizes, todo projeto de pesquisa que envolva o ser humano, individual ou coletivamente, de forma direta ou indireta, em sua totalidade ou partes dele, incluindo o manejo de informações ou materiais, deve ser submetido à análise de um Comitê de Ética de Pesquisa (CEP) da Instituição onde se realizará a pesquisa. No país existem hoje, perto de 400 Comitês de pesquisa atuando em conjunto com a CONEP. PORTAL MÉDICO- De acordo com as normas definidas pela CONEP toda pesquisa que envolve seres humanos tem que ser apresentada a um Comitê de Ética em Pesquisa na Instituição onde se realizará. Quais as medidas previstas para proteger os voluntários que participam destas pesquisas? WILLIAM HOSSNE- O CEP, embora instituído pela Direção da Instituição (respeitadas as normas da Resolução CNS 196/96) e depois devidamente registrado na CONEP, deve ter total liberdade de trabalho, não podendo sofrer qualquer tipo de pressão e nem estar submetido a conflito de interesses. Além disso, o CEP tem sempre caráter multi e transdisciplinar, não podendo haver mais que metade de seus membros pertencentes à mesma categoria profissional; os demais membros devem ser profissionais da área da saúde, das ciências exatas, sociais e humanas (juristas, teólogos, sociológos, antropólogos, filósofos, estaticistas) e, necessariamente, pelo menos um membro da sociedade representando os usuários (sujeitos da pesquisa). O CEP, ao aprovar o projeto de pesquisa, passa a ser co-responsável pelos aspectos éticos. Com tais características e tendo como atribuição básica a de garantir e resguardar a integridade e os direitos dos voluntários participantes, objetiva-se a proteção dos sujeitos da pesquisa. Dentro do referencial bioético da autonomia, o sujeito de pesquisa deve assinar o termo de consentimento, não sem motivo, denominado livre e esclarecido e não apenas consentimento informado. O sujeito da pesquisa deve ser esclarecido, dentro da linguagem a ele acessível, sobre o projeto de pesquisa; sua anuência deve ser obtida livre de qualquer coação, coerção e ou indução, de qualquer natureza. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido deve ser avaliado pelo CEP quanto sua adequação e o sujeito de pesquisa retêm uma cópia que lhe assegura direitos de recorrer a instâncias de proteção. O termo de consentimento não é peça de isenção de responsabilidade; pelo contrário, é peça de proteção do sujeito da pesquisa. Os Comitês de Ética institucionais, devidamente registrados no Ministério da Saúde, junto à CONEP, têm prerrogativas para solicitar a criação da Comissão de Sindicância para a devida aprovação de denúncias e ou de fator de que se tenha conhecimento. A CONEP atua como coordenadora do sistema de ética na pesquisa envolvendo seres humanos e é instância de recurso final. PORTAL MÉDICO- No dia 09 de maio, o JAMA (Journal of the American Medical Association) publicou nota considerando incompleta a pesquisa produzida pelo Searle (Pharmacia) com o medicamento para prevenção de complicações cardíacas, Covera, que foi testado entre 1996 e 2000, e não entre 1996 e 2002, como, anteriormente, estava previsto. Para suspender a pesquisa o patrocinador alegou “razões comerciais”, depois de haver dispendido US$ 50 milhões. Como o senhor avalia esta atitude? Em que situação ficam os pacientes que estavam participando deste experimento? WILLIAM HOSSNE- De acordo com a Resolução CNS 196/96, a descontinuidade da pesquisa somente pode ocorrer após a análise das razões da descontinuidade pelo CEP, que aprovou o projeto (item III-3.z). Este ponto é reforçado (item VII-13.f), quando se estipula, dentro das atribuições do CEP, que é considerada eticamente inadequada a descontinuidade sem justificativa aceita pelo CEP que a aprovou. Assim, cabe ao patrocinador e ou ao pesquisador apresentar as razões, cabendo ao CEP aceitar ou não as justificativas. A interrupção referente ao caso específico, é absolutamente inaceitável do ponto de vista ético. Na literatura internacional, bioeticistas de renome também tem se manifestado contrariamente à interrupção na situação mencionada. Contudo, as diretrizes, as normas, os regulamentos dos países desses autores, não contemplam especificamente a questão, como acontece na Resolução 196/96. É uma pena. O caso em tela não é o primeiro na literatura internacional. Tenho ciência de outro caso análogo, ocorrido nos EUA, no qual além da suspensão por razões comerciais, houve proibição quanto à publicação dos resultados. Este é também um ponto que está claramente previsto na Resolução 196/96, a qual estipula que nenhuma cláusula pode impedir a publicação; pelo contrário, exige-se que os resultados da pesquisa sejam tornados públicos, sejam eles favoráveis ou não. PORTAL MÉDICO- Em entrevista dada ao Fantástico no início deste ano, depois de anunciar o nascimento do primeiro clone humano, o líder da seita raeliana, Claude Vorilhon – autodenominado Rael – afirmou que a Clonaid – empresa criada pela seita para realizar experiências de criação de clones humanos – foi mais rápida que suas concorrentes, porque ” centenas de mulheres raelianas se apresentaram como voluntárias para serem mães de aluguel”. Desde o início do ano, a seita se instalou no Brasil com o objetivo de conquistar mais adeptos por aqui. Como a CONEP avalia as declarações de Rael relativas a clonagem de seres humanos? Qual é a posição oficial do país em relação a clonagem de seres humanos? WILLIAM HOSSNE- A CONEP só pode se manifestar quanto aos aspectos éticos suscitados pelos projetos de pesquisa a ela apresentados. Se o país vier a permitir a clonagem, a mesma deveria ainda ser considerada um procedimento ainda em fase de pesquisa e, por isso, deveria ser submetido à avaliação da CONEP, sem o que não poderia ser iniciado. No momento, de acordo com as resoluções normativas da Comissão Nacional de Biossegurança é vedado qualquer processo de clonagem humana. A entrevista do “líder” da seita não está embasada em nenhum fato concreto que seja de conhecimento da CONEP.

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