“O Lula que filmei não é o Lula em estado de pureza original”, diz o documentarista João Moreira Salles (“Nelson Freire”) a respeito de “Entreatos”, que registra os bastidores dos últimos 30 dias da campanha presidencial de 2002. A equipe de Salles teve acesso privilegiado a reuniões, viagens de avião, preparativos para gravações de TV e outros momentos reservados. Salles acredita, no entanto, que o então candidato não deixava de atuar. Havia uma câmera por perto, e ele parecia não se esquecer disso. A avaliação do cineasta funciona também como alerta para quem espera do filme o registro íntimo do “verdadeiro” Lula. As circunstâncias são privadas, mas o personagem em cena ainda é o líder político. Talvez mais desarmado e exposto do que se poderia esperar, mas, ainda assim, personalidade pública ciente do seu carisma e do impacto de suas palavras e atos. Reside aí, na projeção (consciente ou não) do líder que ele imagina ser, um dos aspectos mais ricos e polêmicos do documentário. São duas horas de Lula representando Lula. A apreciação do filme passa obrigatoriamente pelo confronto entre as imagens e o conceito que cada espectador formou do ex-sindicalista ao longo dos últimos 25 anos. A montagem final, de 117 minutos, faz o recorte de um Lula convencido da vitória, piadista e conciliador. Saiu assim no filme que Salles preferiu fazer. É razoável supor que diversos outros filmes, muito diferentes, teriam surgido das 238 horas de imagens captadas que restaram. Rodados simultaneamente como partes do mesmo projeto, “Entreatos” e “Peões” têm vida autônoma, mas possibilitam, em conjunto, extraordinária visão da história recente do país. E não só porque nascem de idéias complementares, mas também porque se propõem a experiências sensoriais distintas: “Peões” ouve, “Entreatos” contempla. Entreatos estréia nesta sexta no Rio de Janeiro e em São Paulo, ainda sem previsão de estréia em Recife. Da Assessoria de Imprensa do Cremepe. Com Informações da Folha Ilustrada. Cartaz: UOL Cinema.