Poucas pessoas sabem, mas o Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, foi comprado por um baiano. Um baiano que, em 1896, chegou à presidência da República, coroando uma brilhante carreira política. Médico, graduado pela Escola de Medicina do Terreiro de Jesus, onde também lecionou, por sua competência ficou conhecido como o “artista do bisturi”. Este personagem ilustre da história da Medicina baiana e brasileira foi o Dr. Manoel Victorino Pereira. Este ano, comemoram-se os seus 150 anos de nascimento, juntamente com os 195 de fundação da Primeira Faculdade de Medicina do Brasil. As duas importantes datas serão alvo de homenagens no VIII Congresso Brasileiro de História da Medicina, realizado pela primeira vez em Salvador e em todo o Nordeste, de 13 a 15 de novembro próximos. O evento que está em sua oitava edição é vinculado à Sociedade Brasileira de História da Medicina e ocorrerá na Faculdade do Terreiro. Além das comemorações, também servirá como uma forma de aproximar a Sociedade Brasileira de História da Medicina dos alunos e profissionais médicos nordestinos. “A Sociedade Brasileira é basicamente paulista e mineira; são poucos os sócios de outros estados, principalmente do Nordeste”, afirma o médico Rodrigo Falconi, paulista, membro da diretoria da entidade, e que fará a conferência de encerramento do congresso, “Os 150 anos de nascimento de Manoel Victorino Pereira”. A Sociedade Brasileira de História da Medicina foi fundada em 1997 e tem sede em São Paulo. As comemorações pela fundação da Faculdade de Medicina vêm acontecendo desde o início do ano, com missas, homenagens a professores e palestras. A conferência de abertura do congresso será “Os 195 anos da Faculdade de Medicina da Bahia”, proferida pelo médico e professor emérito da Ufba Geraldo Milton da Silveira, em sessão solene. No total, o evento terá 15 conferências, quatro mesas-redondas e seis discussões com temas livres, distribuídos durante os três dias de atividades. As conferências e mesas-redondas serão realizadas no Auditório Alfredo de Brito. As discussões com temas livres irão acontecer paralelamente, em três salas distintas. Os temas das conferências ressaltam aspectos que foram importantes na pesquisa médica realizada na Bahia e no Brasil. Psiquiatria, medicina veterinária, contribuição da medicina para o desenvolvimento social também serão discutidos dentro de uma perspectiva histórica. Médicos de várias partes do País e professores de instituições como Faculdade de Medicina da USP, Faculdade de Medicina da UFRJ, Universidade Federal de Goiás, dentre outras, foram convidados a participar. Dirigentes de várias entidades médicas, como Ulysses Meneguelli, presidente da Sociedade Brasileira de História da Medicina; Lamartine Lima, presidente do Instituto Baiano de História da Medicina; e Thomaz Cruz, presidente da Academia de Medicina da Bahia, farão conferências e participarão de debates. Presidente da Comissão Geral do evento, o professor Geraldo Milton da Silveira acredita que a realização do VIII Congresso Brasileiro de História da Medicina na Bahia será de grande valia para o movimento de luta pela restauração da Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus. Isso porque, além da arrecadação de recursos para as obras através do pagamento das inscrições, haverá uma visibilidade, através da mídia e dos médicos que participarão do congresso, tanto local quanto nacional, para o estado precário em que se encontra o prédio. O professor confia que, desta maneira, autoridades e entidades médicas possam conhecer o movimento de restauração do prédio e se engajar no esforço pela sua revitalização. O vice presidente Jorge Cerqueira está representando o Cremeb na Comissão Geral do congresso. Bisturi, política e jornalismo Formado pela Faculdade de Medicina da Bahia em 1876, Manoel Victorino especializou-se na Europa e, durante alguns anos, ensinou naquela escola gratuitamente. Foi um apaixonado pela política e, após a proclamação da República, tornou-se o primeiro governador da Bahia, por indicação de Rui Barbosa (na época, ministro da Fazenda). Em 1892, elegeu-se senador e, nas eleições de 1894, foi escolhido para o cargo de vice-presidente da República. Em 10 de novembro de 1896, assumiu a presidência, uma vez que Prudente de Morais teve que se afastar para se submeter a uma intervenção cirúrgica. Dr. Manoel Victorino tentou imprimir sua própria marca no curto período de governo. Seu ato mais importante foi adquirir o palácio presidencial na rua do Catete, no Rio de Janeiro, inaugurado em fevereiro de 1897, transferindo para lá a sede da Presidência da República, anteriormente instalada no Palácio do Itamaraty. O prédio foi palco de eventos históricos, como o suicídio de Getúlio Vargas, em 1954. O médico permaneceu no cargo de presidente até março de 1897. Depois disso, não mais participou da vida pública do país, preferindo se dedicar à medicina e ao jornalismo, colaborando em jornais como O Dia, O País, e Correio da Manhã. Faleceu no dia 9 de novembro de 1902, no Rio de Janeiro. Patrimônio ameaçado por falta de recursos Fundada em 1808, durante a passagem da família real no Brasil, a Faculdade de Medicina da Bahia foi a primeira instituição de ensino médico da Bahia e do Brasil. Destacou-se no cenário nacional como um centro de referência em ensino e pesquisa da medicina. Médicos como Afrânio Peixoto, Nina Rodrigues, Oscar Freire, Alfredo Brito, Juliano Moreira, Martagão Gesteira, Prado Valadares, Pirajá da Silva e Gonçalo Muniz, profissionais de renome em todo o País, estudaram na Escola do Terreiro de Jesus. O acervo histórico do prédio está concentrado no Memorial de Medicina, um órgão suplementar ligado diretamente à Faculdade de Medicina, criado em 1982. O Memorial abriga mais de 5.300.000 páginas de documentos, entre teses, pedidos de matrícula, pesquisas e experiências, além de um patrimônio onde se destacam livros raros dos séculos XIV ao XIX (alguns em latim), livros sobre alquimia e caríssimas coleções. Comporta também uma pinacoteca – a maior da Bahia – com mais de 200 retratos de mestres, pintados por famosos artistas baianos, e o suntuoso mobiliário, que está principalmente no Salão Nobre e na Congregação. As obras de restauração do prédio estão paradas por falta de recursos. “No ano passado, ou antepassado, o governo federal destinou, segundo estou informado, cerca de R$ 14 milhões para a Universidade Federal da Bahia só para restauração dos imóveis da universidade. Nenhum tostão foi repassado para essa casa, para as obras que aqui ocorrem, e isso é um desalento muito grande”, lamenta o professor Geraldo Milton da Silveira. Programação Dia 13 – Quinta-feira 08:30 às 09:00 h – Conferência: “Hospital Real Militar da Bahia (1779)” – Antonio Carlos N. Brito (BA) 09:05 às 09:35 h – Conferência: “História da saúde e da medicina como história da sociedade” – Nízia Trindade Lima (RJ) 09:40 às 10:10 h – Conferência: “O escorbuto nas viagens do descobrimento feitas por Vasco da Gama e Cabral” – Ulysses Meneghelli (SP) 10:30 às 12:00 h – Mesa-redonda: “O ensino médico no Brasil” – Moderador: Manoel Barral Netto (BA); Participantes: Marco Porto (RJ), José Antonio Souza (BA) e Flávio Coelho Edler (RJ) 14:00 às 14:30 h – Conferência: “Escola Tropicalista da Bahia” – Rodolfo Teixeira (BA) 14:35 às 15:05 h – Conferência: “Mal de engasgo e doença de chagas: a solução de um quebra-cabeça” – Joffre Marcondes de Rezende (GO) 15:10 às 16:40 h – Mesa-redonda: “História da Psiquiatria Brasileira” – Moderador: Rosa Garcia (BA); Participantes: Miguel Chalub (RJ); William Dunningham (BA); Othon Bastos (PE) e Ronaldo Jacobina (BA) 19:00 h – Sessão solene de instalação: Conferência: “Os 195 anos da Faculdade de Medicina da Bahia” – Geraldo Milton Silveira (BA) Dia 14 – Sexta-feira 08:30 às 09:00 h – Conferência: “Escola Médico-legal da Bahia” – Lamartine Lima (BA) 09:05 às 09:35 h – Conferência: “Etiologia geral à margem da história” – Jorge Michalany (SP) 09:40 às 10:10 h – Conferência: “Origem e evolução da instituição hospitalar” – Lybio Martire Jr. (SP) 10:30 às 12:00 h – Mesa-redonda: “Contribuição da medicina na evolução da veterinária brasileira”. Moderador: Geraldo Cézar de V. Torres (BA). Participantes: Percy Infante Hatschback (GO); Clotilde de Lourdes Germiniani (PR); Ardson José Leal (BA) e Wilma da Albuquerque Franco (BA) 14:00 à a Uzêda (BA). Participantes: Maria Renilda Nery Barreto (BA); Christiane Cruz (BA) e Gisele Sanglard (RJ). Dia 15 – Sábado 08:30 às 09:00 h – Conferência: “Sob a barba do Imperador, o queixo Hadsburgo” – José Barbosa Corrêa (SP) 09:05 às 09:35 h – Conferência: “Os irmãos Pereira. Contribuição à Faculdade de Medicina da Bahia” – Thomaz Rodrigues P. da Cruz (BA) 09:40 às 10:10 h – Conferência: “Os 150 anos de nascimento de Manoel Victorino Pereira” – Rodrigo A. Rossi Falconi (SP) 10:30 às 12:00 h – Lançamento de Livros e sessão de encerramento.
Berço da Medicina brasileira, Bahia sedia encontro histórico em novembro
14/08/2003 | 03:00