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Sem um meio ambiente saudável, não há como encarar os desafios da saúde pública, no Brasil. Campinas – A estreita ligação entre saúde e meio ambiente tem sido exaustivamente repetida, na mídia, quando se trata de falar de qualidade da água, falta de saneamento e doenças de veiculação hídrica. Um pouco em desuso, atualmente, a poluição atmosférica também já freqüentou as manchetes de jornais, vinculada a problemas respiratórios e alguns tipos de câncer. E a contaminação dos solos com poluentes persistentes é outra fonte de preocupações, em evidência nas localidades, que abrigam passivos ambientais de indústrias químicas. Mas a relação entre um meio ambiente saudável e a saúde pública vai muito além disso e possui extensões bem menos evidentes ou divulgadas. Na verdade, os dois setores não só andam de mãos dadas, como de mãos atadas, no bom e mau sentido. O equilíbrio ambiental reflete diretamente em coisas tão díspares como a imunidade da população (isto é, a capacidade natural do organismo reagir a doenças) ou a forma como se manifestam as alergias (isto é, a intensidade com que o organismo reage a agentes irritantes) ou a proliferação de insetos/microorganismos vetores de doenças (como os mosquitos da dengue/malária/oncocercose, o barbeiro da Doença de Chagas, o caramujo da esquissostomose, etc). E não se trata, aqui, apenas do equilíbrio do interior de prédios, dos ambientes de trabalho, dos centros urbanos ou de zonas rurais habitadas. Trata-se de um equilíbrio mais amplo, que inclui o estado dos ecossistemas, mesmo onde não há moradores humanos, visto que as divisas políticas ou administrativas, que separam parques e reservas, oceanos, matas, pradarias, geleiras e desertos, das áreas com atividade humana, não significam nada para vírus, bactérias, protozoários, vento, água, calor, raios de sol e uma infinidade de outros possíveis agentes “facilitadores” da disseminação de doenças. A dinâmica da proliferação de patologias não obedece às regras e leis humanas. Tem lógica própria. Ao encarar os desafios da saúde pública e buscar o controle de epidemias, endemias, desnutrição, câncer, diarréias ou síndromes derivadas de contaminação química, os governos, médicos, sanitaristas e seus auxiliares não podem continuar isolando os fatores ambientais e focalizar apenas na cura, nas tecnologias de diagnóstico e tratamentos. É preciso pensar na prevenção, como há milênios se repete em vão, neste país. Mas numa prevenção vinculada à vigilância, à busca do equilíbrio ambiental desejável. E com um horizonte de longo prazo. Não é possível continuar apenas a “apagar incêndios”, que se revezam nos diferentes compartimentos a que foi reduzida a saúde pública. Uma hora é a volta da dengue, pedindo campanhas de controle do Aedes aegypti. Outra hora é o flagelo da malária, que de tempos em tempos recrudesce e reclama mais vidas. E depois os surtos de leishmaniose, cólera e mesmo gripe ou a SARS da moda. O suceder de emergências nunca terá fim se o foco de quem cuida da saúde pública permanecer apenas no atendimento do que é urgente, sem uma reflexão sobre o todo e sua relação com os processos de urbanização acelerada, de favelização, de agressão concentrada e continuada ao meio ambiente. Um ensaio desta reflexão, absolutamente indispensável, está no novo número da revista Ciência & Ambiente (edição 25), publicada pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), do Rio Grande do Sul. Inteiramente dedicado à Saúde e Meio Ambiente, a revista reúne artigos de 20 especialistas das organizações Panamericana e Mundial de Saúde (Opas/Brasil e OMS), Fundação e Instituto Oswaldo Cruz, das universidades Federal de Minas Gerais (UFMG), de São Paulo (USP) e Federal de Santa Maria e da Fundação Nacional de Saúde (Funasa). A leitura deveria se tornar obrigatória para quem trabalha em saúde pública no Brasil e para os setores governamentais, que a financiam. Sobretudo porque os artigos não tratam da contabilidade dos sistemas oficiais de saneamento, vigilância sanitária, gestão de lixo, doenças tropicais. Tratam de uma contabilidade da vida. Das opções que podem ser feitas com um mesmo orçamento, quando se junta causa e efeito e se traduzem necessidades em mobilização, ações concertadas e lógicas, em lugar de apenas correr atrás dos prejuízos, aqui entendidos no sentido figurado e no real. O país precisa de mais ensaios do gênero, que consigam chegar aos círculos economicistas de Brasília. Liana John

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