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“ São orgãos como o Conselho Federal de Medicina que propiciam uma discussão nos meios acadêmicos sobre a melhor forma dos profissionais de saúde darem sua contribuição ao controle do tabagismo” este é o posicionamento da diretora do Programa Mundial de Tabagismo da Organização Mundial de Saúde, OMS, Vera Luiza da Costa, que em entrevista exclusiva para o PORTAL MÉDICO comentou a MP 118/03, que liberou a publicidade de cigarros em eventos esportivos. 1) Quais as principais mudanças que a Medida Provisória N° 118/2003 traz para a legislação brasileira? A lei 10.167/00 proíbe qualquer propaganda de produtos do tabaco exceto nos pontos de venda. A lei também proíbe a promoção de produtos de tabaco e o patrocínio de eventos culturais e esportivos, incluindo a propaganda de cigarros, durante a transmissão pela televisão. O ponto pendente da lei que teria aplicação plena neste ano foi a proibição da publicidade de cigarros nos eventos esportivos internacionais, como foi o caso da Fórmula 1, recentemente realizada em São Paulo. A medida provisória emitida pelo governo permitiu que se estendesse este prazo até 2005 e tornou obrigatória a transmissão de mensagens de advertência na tela no início e no final do evento esportivo, a cada quinze minutos. O Ministério da Saúde teria também a possibilidade a seu critério de usar os recintos esportivos para divulgar campanhas contra o fumo. 2) A medida provisória representa um retrocesso em termos de legislação anti-tabaco? O fato de uma medida provisória ter sido emitida às vésperas da corrida causou um grande sentimento de decepção não só no país, mas internacionalmente, pois a expectativa era de que a lei fosse cumprida e de que o Brasil continuasse mandando uma mensagem ao mundo e aos países em desenvolvimento de que controlar o tabagismo é possível mesmo em situações onde grande interesses econômicos estão envolvidos. O fato é que quando a publicidade atravessa fronteiras torna-se difícil fazer com que a lei se cumpra. E este é um dos pontos que muitos países no mundo ainda não conseguiram resolver totalmente. Infelizmente, após a publicação da MP° 118/03 no Brasil, abriram-se oportunidades para que o mesmo ocorresse em outros eventos esportivos como é o caso da Copa América. A FIFA declarou as Copas do Mundo livres da propaganda do tabaco e vem encorajando todos os torneios e copas regionais a não aceitarem este tipo de publicidade, o que já acontece nos torneios de futebol em outras regiões como é o caso da Copa Ásia. É uma pena que na região das Américas esta medida não tenha sido considerada, pois cigarros e esporte não têm rigorosamente nenhuma relação. Com isto, a Copa América, bem como a Fórmula 1, prestam um deserviço à saúde pública da região e do mundo. O Comitê Olímpico Internacional também declarou os jogos olímpicos livres da propaganda do tabaco, mostrando que também nos jogos de inverno, nas Olimpíadas especiais o espírito olímpico não se mistura com o uso do tabaco. Estes exemplos mostram que nenhum esporte deixa de exisitr se deixar de receber recursos da indústria tabagista. A experiência mundial mostra que outros patrocinadores surgem, permitindo a continuidade das atividades. A mesma lógica que a indústria usa através dos esportes para vincular uma imagem saudável ao usuário de cigarros ela aplica aos eventos culturais, associando o cigarro a arte e cultura como em filmes, peças de teatro, música, dança, moda e todas atividades que geram lazer e sentimentos de inclusão e participação no grupo e na sociedade. Alarmada com esta tendência, a Organização Mundial de Saúde estabeleceu, neste ano, como tema para a comemoração do Dia Mundial sem Tabaco “Filmes e Moda Livres de Tabaco”. 3) A Organização Mundial de Saúde, OMS, conta com estudos que comprovem a eficácia da propaganda de cigarros entre jovens e crianças associados a eventos esportivos? Estudos do Banco Mundial em mais de 100 países com restrições variadas na publicidade e promoção de produtos do tabaco mostram que a proibição total da propaganda e da promoção de produtos do tabaco podem reduzir o consumo em 7%. Mas esta proibição só é efetiva se atingir todos os meios de comunicação, as marcas, logotipos e a própria propaganda institucional. Isto se deve primariamente ao fato de que quando se proíbe a publicidade em um meio de comunicação, a indústria fumageira substitui esta publicidade ou promoção em outros meios, tornando proibições parciais pouco ou não efetivas. As crianças se sentem atraídas pela publicidade e há estudos mostrando que crianças com 6 anos de idade identificam determinadas logomarcas como sendo de cigarros. Crianças que gostam de Fórmula 1 tem duas vezes mais risco de se tornarem fumantes do que as que não se interessam por corridas de automóveis. Para se ter uma idéia, durante a realização de uma corrida de Fórmula 1 veiculam-se para o espectador cerca de três mil vezes a logomarca de cigarros presentes na roupa dos corredores, nos carros e nas pistas. 4) Se a Lei N° 10.167/00 tivesse entrado em vigor, como ficaria o cenário brasileiro de combate à “epidemia de tabaco” ? Muito melhor: a lei teria sido cumprida, mais uma estratégia enganosa da indústria fumageira de promoção de produtos de tabaco teria sido abolida e a exposição das crianças à publicidade de produtos do tabaco estaria mais reduzida ainda. A proibição total da publicidade e promoção dos produtos do tabaco continuaria sendo um desafio para o país mas este estaria um pouco mais próximo deste objetivo, não permitindo que se estimulasse os jovens a começarem a fumar para repor no mercado os fumantes perdidos com a morte pelas doenças tabaco-relacionadas. Apesar da restrição da publicidade apenas aos pontos de venda, ela ainda existe e passou a ser usada de forma intensa pela indústria para disputar mercado para suas marcas e aumentar as vendas; atividades junto ao comerciante de cigarros fazem parte da estratégia de influência sobre o consumidor. A investigação de documentos secretos da indústria fumageira, recuperados como resultado de litígio em países que acionaram a indústria de cigarros pelo ônus que esta causava aos sistemas de saúde são incontestáveis: a indústria sabe que alicia crianças e jovens com as suas campanhas publicitárias, o patrocínio de eventos culturais e esportivos e as estratégias de marketing. Ela usa inescrupulosamente estas estratégias com um único objetivo, que é vender e lucrar. E usa todos os métodos mais modernos de marketing para induzir o consumo por este grupo populacional mais ingênuo e mais sujeito à sua influência. 5) E como está o cenário mundial de combate a propaganda tabagista? Em que países já existem iniciativas que podemos destacar? Nenhum país conseguiu ainda vencer a luta contra o fumo, mas vários conseguiram reduzir seu consumo pela população. Parte da impossibilidade de vencer a guerra contra o tabaco se deve a fatores que não dependem apenas do trabalho dentro do país, mas atravessam as fronteiras: o exemplo das imagens por tv a cabo vindas de outros países, o contrabando e as vendas de cigarros através da Internet são apenas alguns dos exemplos de como este tema pede a atenção especial dos países na formulação de um acordo internacional para seu controle. Este entendimento fez com que os 192 países membros da OMS negociassem a Convenção Quadro para o Controle do Tabaco que acorda mecanismos legais internacionais para reduzir o consumo de tabaco no mundo e lida com todas as consequências econômicas e sociais desta redução. Dos países que mais avançaram no mundo nesta área estão o Canadá, a Noruega, a Finlândia, a África do Sul, a Polônia, a Tailândia e o Brasil. Em todos eles, um grupo de medidas educativas e regulatórias que passaram pela proibição da publicidade, aumento de preços, advertências à saúde nos maços de cigarro, medidas de proteção ao não fumante foram essenciais, mas estas medidas foram implementadas em grau e intensidade variáveis de país para país. Mas um fato é inegável: em todos os países que avançaram em termos de ações de controle do tabagismo um ponto essencial foi o investimento na melhoria da informação da população com a formação de uma massa crítica que não permitiu que os interesses comerciais da indústria do tabaco fossem maiores do que os da saúde pública da população. 6) Já está formada no Congresso Nacional a Comissão Especial que vai analisar o mérito da Medida Provisória N° 118/2003. A senhora acha que ela vai ser aprovada nos termos em que foi proposta pelo Executivo? Tenho a informação de que várias emendas foram propostas e de que uma audiência pública trará a discussão à público, o que considero um grande ponto positivo. Do ponto de vista de saúde pública, não há nenhum questionamento possível. A propaganda de produtos de tabaco, em qualquer forma é enganosa, induz ao consumo, contamina a sociedade com uma aceitação do uso de cigarros como um fato normal e não podemos deixar em momento algum de considerar o tabaco como droga, uma das drogas que mais causa dependência no mundo e também a que mais mata a população mundial. A indústria vende um produto que mata e como tal deve ser tratado. São quase quatro milhões de mortes precoces por ano no mundo e se a epidemia tabagística persistir seguindo as mesmas tendências, serão 10 milhões de mortes por ano em 2020, das quais 70% em países em desenvolvimento como o Brasil, que ainda lutam com as doenças infecciosas. 7) Existem ações programadas de protesto contra a aprovação da Medida Provisória N° 118/2003 pelo Congresso Nacional? A Coalisão de Organizações Não Governamentais “Por um Mundo Livre de Tabaco” tem se manifestado veementemente contra esta medida provisória, sendo que uma de suas ONGs mais ativas, a Redeh – Rede de Desenvolvimento Humano – conta com uma rede de centenas de rádios no país repercutindo esta discussão. A Sociedade Brasileira de Cardiologia também tem se manifestado publicamente se opondo a esta medida. Internacionalmente, são centenas de ONGs pedindo ao governo brasileiro para reconsiderar a medida provisória e prestar um serviço de saúde pública à sua população além de enviar uma mensagem ao mundo de que é possível trabalhar no controle deste fator de risco que mata um em cada dois de seus usuários atuais. Certamente, o papel das sociedades médicas, de enfermagem, de odontologistas e farmacêuticos, entre outras, a exemplo do que acontece no resto do mundo, será cada vez mais importante porque são estes órgãos que trazem consigo a credibilidade da ciência para ser apresentada e dividida com advogados, juízes, parlamentares e o governo em geral. São orgãos como o Conselho Federal de Medicina e todas as suas instâncias regionais que propiciam uma discussão nos meios acadêmicos sobre a melhor forma dos profissionais de saúde darem sua contribuição ao controle do tabagismo e transmitem um alerta à população de que a propaganda de cigarros deve fazer parte da história, como uma estratégia de venda que deixou de existir em benefício da saúde pública.

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