As questões éticas relacionadas ao uso da inteligência artificial na medicina, como possível desvirtuamento da relação clínica, afastamento entre profissionais de saúde e as pessoas doentes, menor proteção do direito à privacidade individual e excessiva dependência da robótica, foram alguns dos pontos levados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) ao Senado Federal nesta quarta-feira (4).
A 2ª vice-presidente do CFM, Rosylane Rocha, falou sobre o assunto durante o simpósio “O Futuro da Medicina e a Medicina do Futuro”, organizado pela Frente Parlamentar Mista da Medicina (FPMed). O grupo é presidido pelo senador Dr. Hiran (PP-RR). Além dos desafios éticos impostos por conta da chegada das novas tecnologias, a conselheira citou alguns exemplos dos benefícios do uso da IA na área da saúde, como ficam as práticas médicas e a respeito da formação de novos profissionais diante desse cenário.
No início de sua exposição, a 2ª vice-presidente do CFM questionou se as escolas médicas brasileiras, que já disponibilizam 42 mil vagas por ano, estão ofertando conteúdo em suas grades curriculares para a formação de bons profissionais capazes de lidar com a IA.
“O Brasil nunca contou com tantos médicos. Hoje, já somos 600 mil. E não tenho dúvida de que, todos os dias, reafirmamos nosso compromisso nos mais diversos locais de trabalho. Mas, diante do avanço da inteligência artificial, será que estamos preparados para lidar com as ferramentas de assistência à saúde que estão surgindo?”, perguntou.
Ela ressaltou que o CFM tem se debruçado sobre as questões relativas à IA. No mês passado, por exemplo, o tema foi tratado no II Encontro Nacional dos Conselhos de Medicina. No documento final da reunião, a Autarquia considerou ser “urgente preparar a medicina e os médicos para os avanços da tecnologia em saúde, em especial para a implementação da inteligência artificial”. Em julho, o CFM foi palco do maior congresso de bioética do mundo, em que o assunto também foi bastante discutido entre os maiores especialistas da área.
Rosylane lembrou ainda que o CFM foi o órgão responsável por regulamentar a prática da telemedicina no Brasil, por meio da Resolução nº 2.314/2022, como forma de serviços médicos mediados por tecnologias e de comunicação.
Benefícios – Ela citou que o uso da inteligência artificial é benéfico em diferentes áreas da medicina, como na análise de dados provenientes da interpretação de imagem (radiologia convencional, tomografia computorizada, ressonância magnética ou ultrassonografia), no rastreio oncológico de diferentes patologias e nas ciências cardiovasculares e nas neurociências.
Com base em livro publicado pelo professor e médico português Rui Nunes sobre IA, a conselheira do CFM destacou aspectos éticos relevantes da inteligência artificial na prática clínica, como possível desvirtuamento da relação clínica, afastamento entre profissionais de saúde e as pessoas doentes, queda da relação de confiança na prática clínica, diluição da responsabilidade, menor proteção do direito à privacidade individual e excessiva dependência da robótica inteligente.
“Não custa lembrar: embora seja muito importante, a IA é uma ferramenta que auxilia, mas não substitui o julgamento clínico. A responsabilidade final pelas decisões médicas permanece com o profissional”, encerrou.
Além de Rosylane, participaram do evento os conselheiros federais Alceu Pimentel, Antonio Meira, Bruno Leandro Souza, Cibele de Carvalho, Leopoldina da Silva Leite, Marcelo Prado, Viviana Lemke, João Helio de Sousa e Cleiton Bach. Parlamentares e representantes de outras organizações da sociedade civil e de entidades médicas participaram do evento.