Os desafios enfrentados diariamente pelos serviços de urgência e emergência estiveram no centro dos debates da Mesa 2 do IV Fórum de Medicina de Emergência do Conselho Federal de Medicina (CFM), realizado nesta quarta-feira (18). A mesa, intitulada “Qual o desafio da Medicina de Emergência?”, foi presidida pelo conselheiro federal Estevam Rivello Alves (TO), coordenador da Câmara Técnica de Medicina de Emergência do CFM, e secretariada por Maria Camila Lunardi, presidente da Associação Brasileira de Medicina de Emergência (Abramede) e membro da mesma câmara técnica.
A programação reuniu especialistas para debater temas cruciais, como a superlotação dos serviços, a necessidade de regulação qualificada e os desafios estruturais que afetam diretamente a segurança e a mortalidade dos pacientes, além das condições de trabalho dos profissionais de saúde.

Na conferência “Superlotação! Como otimizar a triagem nas UPAs”, a enfermeira Marisa Aparecida Amaro Malvestio, profissional do Atendimento Pré-Hospitalar, destacou que a superlotação é um fenômeno mundial e ocorre quando a demanda por serviços de emergência supera os recursos disponíveis. Segundo a palestrante, a espera prolongada é um dos principais fatores associados ao problema e está diretamente relacionada ao aumento da mortalidade. Ela citou estudo brasileiro de 2025 que aponta crescimento de 6% nas chances de óbito hospitalar a cada dia adicional de permanência do paciente no pronto-socorro.
Marisa ressaltou ainda que a superlotação não é um problema isolado das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), mas de toda a Rede de Urgência e Emergência (RUE). Defendeu a importância do Acolhimento com Classificação de Risco, conforme preconizado pela Política Nacional de Humanização do SUS, destacando que a triagem deve ir além da simples atribuição de cores e tempos de espera, incorporando a identificação de riscos e vulnerabilidades. Como exemplo, apresentou o Protocolo Catarinense de Acolhimento com Classificação de Risco (PCACR), que utiliza parâmetros biológicos, sociais e organizacionais, e enfatizou que o enfrentamento da superlotação exige compreensão de suas causas e gestão integrada dos fluxos de entrada, permanência e saída dos pacientes.

Na sequência, o coordenador do SAMU de Jundiaí (SP), Marcelo Okamura, abordou o tema “No que a regulação qualificada ajuda o SAMU?”. Em sua exposição, destacou que a regulação médica é um conjunto de ações voltadas à organização, priorização e gerenciamento do acesso aos serviços de saúde, sendo uma das etapas mais críticas da assistência em urgência. Okamura defendeu modelos de gestão mais integrados à realidade brasileira e ressaltou o papel estratégico das centrais de regulação, comparadas por ele a “grandes hospitais que recebem pedidos, e não pacientes”.
O palestrante também abordou o uso de tecnologias e da inteligência artificial no atendimento pré-hospitalar, citando estudos recentes que apontam seu potencial de apoio à gestão de fluxo e à tomada de decisão. Contudo, enfatizou que a IA não deve substituir o profissional de saúde. “A decisão de um ser humano cuidar do outro deve ser feita por um ser humano, não por uma máquina”, afirmou.

Encerrando a mesa, o professor adjunto de Medicina de Emergência da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Lucas Oliveira Junqueira e Silva, apresentou a conferência “Por que temos PS sobrecarregados? Gerenciando o caos no Departamento de Emergência”. Ele explicou que a superlotação ocorre quando o número de pacientes excede a capacidade estrutural do serviço e destacou que o principal fator do problema não está na entrada, mas no bloqueio de saída dos pacientes, especialmente pela falta de leitos de internação.
Segundo o especialista, manter pacientes internados por longos períodos na emergência aumenta a mortalidade, eleva custos, contribui para a exaustão dos profissionais e intensifica episódios de violência nos serviços. Lucas lembrou que a Resolução CFM nº 2.077/2014 estabelece que pacientes não devem permanecer mais de 24 horas nos serviços de emergência e defendeu que o País precisa investir na ampliação de leitos e na gestão eficiente da rede, e não apenas na abertura de novas UPAs. “A Medicina de Emergência brasileira evoluiu tecnicamente. Agora, precisamos evoluir politicamente. A superlotação mata mais do que muitas doenças que tratamos”, afirmou.
A Mesa 2 reforçou a necessidade de soluções sistêmicas, com foco na gestão da rede, na regulação qualificada e no fortalecimento da Medicina de Emergência como eixo estratégico para a segurança do paciente e a sustentabilidade do sistema de saúde. Para acompanhar os debates da íntegra, acesse aqui.