
A construção de diretrizes que avaliem o efeito da espiritualidade nas condições de saúde e a necessidade de se respeitar as crenças do paciente nortearam os debates das duas mesas redondas realizadas no horário da tarde do I Fórum da Comissão de Saúde e Espiritualidade – Construindo a Diretriz Clínica, realizado na sede do CFM nessa sexta-feira (26).
O evento foi transmitido pelo canal do CFM no YouTube. Assista AQUI.
Coordenadora da mesa redonda “Parâmetros científicos para a construção de diretrizes”, a conselheira federal Yáscara Lages lembrou que a espiritualidade era vista como algo apartado da ciência, mas que hoje há um consenso de que não há essa dicotomia. “A espiritualidade, ou falta dela, afeta o desenvolvimento da doença. E este é um espaço para unirmos esses dois conhecimentos”, afirmou.

Neurologista Maria do Desterro Leiros da Costa
A primeira participante da mesa foi a neurologista e professora aposentada de neuroanatomia aplicada na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Maria do Desterro Leiros da Costa, que ao falar sobre o tema “Interface entre neurociência e espiritualidade”, discorreu sobre a formação do cérebro humano e mostrou como áreas do cérebro são ativadas por atividades como meditação e práticas espirituais. “Temos vários estudos mostrando o aumento da plasticidade do cérebro após a realização dessas atividades”, explicou.
Pesquisa – Em seguida, o médico e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora Giancarlo Lucchetti, falou sobre “Escalas avaliando espiritualidade: quando utilizar e como interpretar?”. Após explicar a diferença entre os conceitos mais restritos e amplos de espiritualidade, Luchetti enfatizou que o pesquisador interessado no tema precisa ter claro quais são os seus objetivos.
“A minha conclusão é de que existe uma diferença na utilização de escalas de pesquisa e instrumentos para anamnese espiritual. Diversas escalas já foram criadas e validadas para o contexto brasileiro, mas antes de qualquer coisa, o pesquisador deve pensar na população e no que ele quer aferir”, explicou.

Professor da faculdade de medicina da UFJF Giancarlo Lucchetti
“Anamnese espiritual e intervenção sobre valores morais” foi o tema da palestra do cardiologista Sérgio Menezes. “Temos de respeitar a espiritualidade e o propósito de vida do paciente. Não podemos impor uma religião”, aconselhou. Ele também fez uma diferença entre a escuta compassiva e a empática. “Na primeira, temos de estar preparados para agir. Não adianta perguntar algo, se não tivermos uma resposta, nem sabemos como ajudar”, refletiu.
Debatedor dessa mesa redonda, o neurologista e membro da Comissão de Espiritualidade Paulo Porto fez um resumo do que foi debatido. “Para nós, ficou claro que ciência e espiritualidade são indissociáveis”, concluiu.
Diretrizes – A mesa seguinte tratou do tema “Diretrizes nas especialidades”, com participantes da psiquiatria, dos cuidados paliativos e da cardiologia. Para a coordenadora da mesa, conselheira federal Maíra Dantas, a espiritualidade é importante tanto na reabilitação, como na cura, e “tanto no tratamento de doenças crônicas, como nos cuidados paliativos. “Quando as expectativas da ciência estão limitadas, ainda podemos oferecer muito aos nossos pacientes”, defendeu.

“Diretriz de espiritualidade em psiquiatria: da proposta à publicação”, foi o tema da palestra da participante da Comissão de Estudos e Pesquisa em Espiritualidade e Saúde Mental da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) Marianna Costa, contou como foi a construção da diretriz da ABP e discorreu sobre a realização da anamnese espiritual em pacientes psiquiátricos. “Temos de analisar, por exemplo, o impacto negativo das crenças religiosas no transtorno mental. Pois ao mesmo tempo em que a religiosidade pode ser fator positivo, às vezes ela pode mascarar algum transtorno psiquiátrico”, alertou.
Responsável por falar sobre o tema “Cuidados paliativos em 2025: Diretriz e espiritualidade”, o psiquiatra e paliativista Henrique Gonçalves Ribeiro, afirmou que a espiritualidade sempre acompanhou os cuidados paliativos e mostrou como ela impacta na saúde dos pacientes. “Temos de estar abertos para reconhecer a importância da espiritualidade na vida do paciente e de respeitar as suas crenças”, afirmou. Ribeiro alertou que os médicos também precisam desenvolver seu lado espiritual. “Precisamos ter o nosso próprio autocuidado”, defendeu.
Anamnese espiritual – Após apresentar um histórico de como a Sociedade Brasileira de Cardiologia construiu a sua diretriz para uma anamnese espiritual dos pacientes, o médico e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro Roberto Esporcatte, defendeu que o Brasil seja vanguarda na apresentação de uma diretriz mundial.

Cardiologista Roberto Esporcatte
“Começamos a discutir a criação da nossa diretriz em 2016 e, durante todos esses anos, fomos muito rigorosos, sempre deixando claro que não se tratava de religião. Agora, o nosso próximo passo será apresentar uma proposta nos congressos internacionais. É nossa responsabilidade levar o tema da espiritualidade na medicina para todo o planeta, pois o nosso terreno é fértil, já que somos um país ecumênico que produz pesquisa de alta qualidade”, defendeu.
O secretário da mesa, geriatra e membro da Comissão de Saúde e Espiritualidade do CFM Emílio Hideyuki Moriguchi, afirmou que foi muito importante a visão dos especialistas sobre as diretrizes. “Ficou claro que é necessário ouvir o paciente e fazê-lo refletir, sem impor nenhuma crença”, afirmou.