
O Conselho Federal de Medicina (CFM) participou, nesta terça-feira (25), de audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado Federal para debater a iniciativa da Prefeitura de Fortaleza (CE) de disponibilizar implantes subdérmicos de etonogestrel como método contraceptivo para crianças e adolescentes de 10 a 19 anos na rede pública de saúde.
O CFM foi representado pelo conselheiro federal pelo Rio de Janeiro, Raphael Câmara Medeiros Parente, relator de pareceres sobre o tema. A audiência reuniu ainda especialistas de diversas áreas da medicina, parlamentares, representantes de entidades médicas e da Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza, além de duas vereadoras da capital cearense.
Em sua exposição, o conselheiro classificou como “completo absurdo” o uso de contraceptivos hormonais em crianças de 10 anos, defendendo que, nessa faixa etária, a prioridade deve ser a proteção integral e a educação sexual em linguagem adequada, e não a medicalização da infância.
O conselheiro federal lembrou que, no caso de menores de 14 anos, a legislação brasileira considera a atividade sexual como estupro de vulnerável, ressaltando que políticas que normalizam relações sexuais nessa faixa etária podem, na prática, acabar protegendo agressores em vez de proteger as vítimas, visto que o uso de contraceptivos pode mascarar abusos.
Raphael Câmara também chamou atenção para a ausência de evidências científicas que respaldam o uso do implante de etonogestrel (Implanon) em crianças, destacando que a própria bula do medicamento se baseia em estudos clínicos realizados com mulheres entre 18 e 40 anos.
Segundo enfatizou, “não há estudos específicos envolvendo meninas de 10 e 11 anos”, o que torna a adoção da medida pela gestão municipal de Fortaleza uma espécie de “experimento” sem respaldo técnico em âmbito internacional. O conselheiro citou ainda documentos de entidades científicas estrangeiras que apontam maior risco de efeitos colaterais em adolescentes e lacunas importantes de conhecimento nessa faixa etária.
Ao tratar da dimensão ética e regulatória, o representante do CFM lembrou parecer nº 2/2023, do qual foi relator, que estabelece que a inserção e a retirada do implante contraceptivo são atos privativos do médico, não podendo ser realizados por outros profissionais de saúde.
Raphael Câmara ressaltou que o médico está vinculado a um rigoroso Código de Ética e que a indicação de implantes hormonais para crianças poderia configurar infração ética grave, passível de responsabilização nos Conselhos Regionais de Medicina. “Se um médico implantar um Implanon em crianças de dez anos, ele certamente terá problemas do ponto de vista ético!”.
O conselheiro também questionou a base técnica da proposta e exigiu que a Secretaria de Saúde de Fortaleza apresentasse os estudos e pareceres que fundamentaram a iniciativa. Ele ressaltou que a indicação não está prevista nos programas do Ministério da Saúde nem foi incorporada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). Além disso, Câmara alertou para o potencial impacto financeiro de uma expansão descontrolada do uso desses contraceptivos, destacando a importância do princípio da equidade no sistema público e a necessidade de proteger crianças e adolescentes contra intervenções sem segurança comprovada para essa faixa etária.
Ao término de sua explanação, o representante do CFM enfatizou: “A defesa de crianças e adolescentes é uma das prerrogativas máximas do Conselho Federal de Medicina. As crianças devem ser protegidas sempre. A gente está falando em hormônios agindo em corpos de crianças como contraceptivo, isso exige cuidado. Criança deve ter educação sexual, não usar contraceptivo”.