A preocupação com a queda no número de consultas, exames de rastreamento e outros procedimentos tem sido recorrente entre as entidades médicas. Em abril deste ano, representantes de sociedades de especialidades defenderam junto ao Conselho Federal de Medicina (CFM) a necessidade urgente de se planejar ações para retomada desses atendimentos.

Números oficiais do Ministério da Saúde indicam a realização de 50 milhões de procedimentos médicos ambulatoriais eletivos durante o primeiro semestre de 2021 – 20% a mais em comparação ao mesmo período do ano passado (41,6 milhões). Quando comparados aos primeiros seis meses de 2019, no entanto, ano anterior à pandemia, os resultados ainda figuram em queda de 14%.

 

Da mesma forma que os procedimentos ambulatoriais, o número de cirurgias eletivas demonstra recuperação neste ano, sobretudo nos meses de abril, maio e junho. Ao todo, no entanto, o aumento no primeiro semestre foi de apenas 1,5% em relação ao ano anterior e não foi suficiente para alcançar a quantidade de procedimentos realizada no ano anterior à pandemia.

Em atenção ao alerta das sociedades de especialidades, o CFM prepara uma estratégia nacional para estimular a população a buscar atendimento médico para a prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças, observando as normas de segurança.

Durante a pandemia, a indicação ou contraindicação cirúrgica precisou considerar o perfil epidemiológico de cada localidade, além das recomendações técnicas das autoridades sanitárias e do executivo local, além das atualizações propostas pelas sociedades de especialidades.

Dentre as soluções propostas para enfrentar esse desafio estão a realização de campanhas voltadas aos pacientes, especialmente aqueles com doenças crônicas, para que não abandonem seus tratamentos. Por meio das redes sociais e imprensa, diversas organizações já têm defendido que muitas doenças não podem esperar e, quanto antes forem diagnosticadas, melhor será o resultado de seu tratamento.

Confira abaixo algumas destas iniciativas:

Cardiologia – Segundo levantamento da Sociedade Brasileira de Cirurgias Cardiovasculares (SBCCV), mais de 60 mil brasileiros estão na fila de espera por atendimento cardiológico devido à falta de insumos. A pesquisa, realizada a partir de relatos de 27 hospitais de nove estados brasileiros, constatou que 52% dos serviços de cirurgia cardiovascular já apresentam problemas graves de desabastecimento.

De acordo com a SBCCV, a falta de insumos fez com que, em 2020, menos de 40 mil pacientes fossem operados. Em um ano sem pandemia, aproximadamente 100 mil operações são realizadas no País. A especialidade relata significativa falta de válvulas cardíacas, oxigenadores, materiais especiais e cânulas, usados em cirurgias de ponte de safena, correção de defeitos congênitos, correção de aneurismas e trocas de válvulas cardíacas.

Para os cardiologistas, o represamento dessas cirurgias, além de aumentar o número de mortes por problemas cardiovasculares, deve gerar uma busca ainda maior ao sistema de saúde pós-pandemia. Segundo o ‘cardiômetro’, indicador dos óbitos por doenças do coração criado pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), essa é a doença que mais mata no Brasil, chegando a atingir mais de 400 mil pessoas por ano.

Oncologia – Preocupada com o panorama do câncer em tempos de pandemia, a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) lançou em setembro do ano o resultado de pesquisa entre seus associados para entender os impactos da covid-19 no Brasil. Segundo o levantamento, mais de 74% dos entrevistados informaram que tiveram um ou mais pacientes que interromperam ou adiaram o tratamento por mais de um mês durante a pandemia.

Em campanha, a Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (Sobed) também levantou durante o “Março Azul” que, em 2020, só no SUS o número de exames de sangue oculto nas fezes caiu 23% em relação a ano anterior – 350 mil exames a menos. Apesar de ser um procedimento simples, este exame pode ser decisivo para salvar a vida de paciente com suspeita de câncer colorretal.

Já a colonoscopia, também indicado aos pacientes em que existe uma suspeita diagnóstica, apresentou uma queda percentual ainda mais significativa no ano da pandemia, de acordo com a Sobed. Foram menos 106.030 procedimentos, em comparação com 2019 – uma redução de 31%.

Oftalmologia – Dados levantados pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) também refletem o afastamento dos pacientes por cuidados com a saúde ocular. Em maio de 2020, mês de prevenção e combate ao glaucoma, a especialidade mostrou que quase 1,6 milhão de exames para detecção precoce da doença deixaram de ser realizados no SUS. A queda prejudicou a investigação de possíveis casos novos desta doença, considerada principal causa de cegueira evitável no mundo, contribuindo para o atraso no tratamento e o acompanhamento de situações confirmadas.

Os oftalmologistas também indicaram que pelo menos 6,5 mil cirurgias que são indicadas para tratar ou reverter o glaucoma também deixaram de ser realizadas no SUS no ano passado. A queda, segundo números analisados pelo CBO, foi de 22%. Com a flexibilização do isolamento social na maior parte do País e a retomada das operações, os especialistas temem alta expressiva da demanda e pacientes com a doença em estágio agravado.

Urologia – Quem também alertou para os efeitos da pandemia na saúde dos brasileiros foi a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), que em julho do ano passado divulgou resultado de pesquisa com associados. Cerca de 90% dos participantes informaram ter tido redução igual ou maior que 50% nas cirurgias eletivas e 55% relataram diminuição de pelo menos metade no número de cirurgias de emergência.

Esse panorama acendeu o sinal de alerta na entidade de que boa parte dos pacientes com doenças urológicas (como cânceres, hiperplasia de próstata, incontinência urinária entre outros) possam ter postergado o tratamento pelo receio de contraírem a covid-19.

Além disso, em março deste ano a SBU também apontou que os tratamentos cirúrgicos para a incontinência urinária caíram 60% em 2020, em relação ao ano anterior. A constatação é de que a pandemia agravou o tratamento de várias doenças, entre elas a incontinência urinária, que costuma afetar 45% das mulheres e 15% dos homens acima de 40 anos.

 

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