José Hiran da Silva Gallo*

Recentemente, muito tem se falado sobre a importância e a necessidade de se avaliar os egressos dos cursos de Medicina no país. Os exames seriam feitos sob medida para se conhecer, com base na legislação atual, o nível de preparo desses jovens profissionais que, após anos na graduação, estariam aptos ao exercício da Medicina em sua plenitude. Por ano, em média, o Brasil recebe cerca de 20 mil pessoas com este perfil.

São homens e mulheres, muitos de origem humilde, que assumiram o risco de sonhar de olhos abertos e investiram anos de suas vidas – e alguns, milhares de reais – para concluir sua formação em escolas brasileiras de Medicina (públicas ou privadas). Atualmente, existem 266 cursos de Medicina; em Rondônia, quatro estão de portas abertas.

A relevância da avaliação dos alunos de Medicina é indiscutível. Sobre este ponto não há dissenso. Contudo, o formato que tem sido apontado como o ideal por algumas entidades para fazer este trabalho está muito distante de gerar uma mudança real no aparelho formador de futuros médicos. Isso porque, ao aplicarem um único exame de fim de curso aos egressos, como defendem alguns, apenas criam um fato midiático, uma notícia, mas não  garantem o aperfeiçoamento de todo o processo em favor, sobretudo, da sociedade.

Sem fundamentação científica relevante comprovada, este tipo de abordagem pedagógica, no fim das contas, somente penaliza o egresso ao expor seu despreparo diante do escárnio público. O exame atesta a falta de conhecimento dos estudantes, mas não pune os reais responsáveis por esta situação. Ora, se o produto oferecido, depois de anos em sala de aula, não tem a qualidade que se espera, o caminho lógico seria buscar explicações e adequações de todos os envolvidos no processo.

Neste caso, não seriam também as escolas – que cobram mensalidades vultosas – as encarregadas de assegurar a infraestrutura de ensino adequado (salas de aula, equipamentos, bibliotecas, laboratórios etc.), os professores capacitados, o projeto pedagógico e as áreas de estágio que podem atender às necessidades da população? Não caberia ainda a estas instituições acompanhar a evolução de seus alunos, só permitindo o avanço deles quando houvesse a evolução necessária?

Respostas positivas a estes dois questionamentos são as únicas possíveis. Fora disso, a opção seria a saída fácil e antiética de jogar sobre os ombros dos estudantes a responsabilidade pelas falhas observadas. Como se a culpa pudesse ser resumida em frases do tipo: “ele não teve uma boa educação de base” ou “ela não se empenhou como deveria”.

Esse atalho elimina toda a complexidade de um problema que envolve não apenas alunos, mas uma rede que inclui professores, coordenadores, diretores e gestores públicos. Considerando esta multiplicidade de papéis que interagem na formação dos futuros médicos, o exame de fim de curso não passa de uma fotografia, quando o que realmente importa é o filme completo.

Contra essa distorção existe um caminho viável, já proposto pelo Conselho Federal de Medicina: a realização de exames periódicos, ao longo da graduação, nos quais sejam avaliados os discentes, os docentes e todo o aparato oferecido pelas instituições de ensino superior. Desde a década de 1970, diversos países já perceberam as vantagens dessas avaliações semelhantes ao chamado “Teste de Progresso”.

É consenso sua eficácia como instrumento que mensura o nível da formação oferecido e permite às escolas reconhecer suas deficiências, num processo em que todos ganham: o aluno, as instituições de ensino, os gestores responsáveis pelo sistema educacional médico e, sobretudo, o paciente. Esta é a única opção que permite o aprimoramento da formação médica, ancorada em conteúdos éticos, humanísticos, cognitivos, científicos e técnicos que devem ser aferidos de forma contínua, concentrando-se não só no egresso, mas principalmente na instituição formadora.

Sem essa abordagem, as escolas não serão responsabilizadas e não poderão ser cobradas por melhorias importantes no repertório dos alunos, privando a sociedade de um médico mais preparado e capaz para o exercício de sua profissão. O Congresso Nacional detectou a necessidade de assegurar essa cobrança e, com a Lei Federal 12.871/13, em seu artigo 9º, já instituiu uma avaliação específica para o curso de Medicina a cada dois anos, com instrumentos e métodos que avaliam conhecimentos, habilidades e atitudes.

Este dispositivo regulamentado pela Resolução nº 3/14, do Conselho Nacional de Educação (CNE), que trata das novas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina, deve ser posto em prática em breve. A expectativa é de que seja um marco divisor para a avaliação do ensino médico no país, voltando-se para aqueles que, efetivamente, podem e devem fazer mais.

Essa avaliação de caráter obrigatório, processual, contextual e formativo, conforme prevê a legislação, será de responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), ligado ao Ministério da Educação. Além disso, há um projeto de lei do senador Cássio Cunha Lima que prevê a participação direta do Conselho Federal de Medicina em todas as suas etapas.

Enfim, é passado o tempo de buscar soluções estruturantes para o ensino médico no Brasil. Mudanças não se fazem com paliativos, mas com propostas consequentes, com impacto no terreno prático das ações. É o que espera a Medicina brasileira. É o que quer o povo desse país.

 

* É diretor-tesoureiro do Conselho Federal de Medicina (CFM) e doutor em Bioética.

** Artigo publicado no jornal eletrônico tudorondonia.com, em 25/02/2016.  

 

 
    

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