Escrito por Desiré Carlos Callegari*

Fatos recentes indicam que o governo brasileiro entra a passos firmes no terreno da relativização dos direitos e dos deveres. A leitura de decretos, portarias e mesmo dos discursos das autoridades indicam que, atualmente, a regra em vigor é de para uns tudo, para outros nada. Tal prática, que resgata o dito popular de dois pesos e duas medidas, configura prática incompatível com a responsabilidade de cuidar da cidadania e das garantias individuais e coletivas.

O momento atual me faz pensar em A Revolução dos Bichos, obra emblemática de George Orwell. Essa novela satírica conta a história de uma fazenda onde os animais se revoltam contra os maus tratos impostos pelos humanos. Juntos, tomam o comando da propriedade sob um discurso de igualdade e fraternidade. Aos poucos as diferenças aparecem e, com elas, o encantamento pelo poder. Assim, as regras de convivência vão sendo adaptadas.

“Todos os animais são iguais”, dizia o mandamento máximo dessa comunidade utópica. Com a mudança de comportamento de seus líderes – cada vez mais humanos, como seus antigos carrascos – o texto involuiu para “Todos os animais são iguais mas alguns são mais iguais que os outros”. Mera coincidência, ou não, encontro ecos da arte na vida cotidiana do país.

George Orwell, que também escreveu 1984, onde cria um futuro distopico onde o totalitarismo impede a felicidade, entrega uma trama repleta de mentiras, traições e artimanhas que tornaram a fazenda dos bichos um território dominado por uma ditadura e pelo autoritarismo sem qualquer lampejo de democracia. A distância entre a literatura e o noticiário atual não e tão grande assim.

O desafio atual de nossa sociedade é impedir que essa cultura danosa do dois pesos, duas medidas prospere. Afinal, vivemos num país onde não podem existir “meios princípios”, “meios valores”. Contudo, no episódio recente do Programa Mais Médicos, em que cubanos desertaram descontentes desigual a que eram submetidos, ficou patente que, para alguns, a exploração dessas pessoas é plenamente justificável.

Quem pensa dessa forma esquece que, ao contrário da fazenda de George Orwell, a lei ainda é igual para todos no Brasil. Por exemplo, por mais que seja necessário, o uso de mão-de-obra sem respeitar a lei trabalhista brasileira ou aspectos mínimos dos direitos humanos se justifica? Para os Conselhos de Medicina, a resposta é um vigoroso não. Aos que ainda titubeiam, faço o convite de se colocar na pele dos cordeiros.

Se seu marido, sua esposa ou seu filho tivessem que trabalhar todos os dias, sem direito de sair à noite ou de viajar sem antes prestar contas a um “supervisor”, isso seria justo? Se seu pai ou seu melhor amigo em lugar de salários ganhassem bolsas de estudo e não contassem com 13º salário, férias remuneradas e auxílio doença, isso seria ético? Se você, após um mês de trabalho, recebesse apenas 10% do seu salário, podendo gastar a metade desse valor apenas em alguns anos e vendo os 90% restantes serem sugados pelos cofres do seu governo, estaria de acordo?

Diante de tantos abusos é fácil ficar indignado. Assistimos de camarote casos de patentes agressões à lei, tendo como vítimas profissionais ligados ao Mais Médicos (brasileiros participantes e os intercambistas estrangeiros). Reagir a este tipo de situação está longe de ser corporativismo. Trata-se de um compromisso cívico e de defesa do exercício da cidadania plena dos brasileiros e pessoas de qualquer nacionalidade que estejam na República Federativa do Brasil.

 

* É 1º secretário do Conselho Federal de Medicina (CFM), conselheiro federal representante do estado de São Paulo.    
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