Mauro Luiz de Britto Ribeiro

O Conselho Federal de Medicina (CFM) lamenta que o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) tenha perdido a oportunidade de recolocar no trilho da legalidade o funcionamento do Mais Médicos. Isso ocorreu quando essa corte não acatou, recentemente, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida contra esse programa de caráter eleitoreiro e sem condições de oferecer ao País as soluções definitivas para o acesso à assistência em saúde.

Em seu voto, o relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello, recomendou a suspensão de pontos específicos do Mais Médicos. Por exemplo, para ele, cubanos que participam do programa deveriam receber a integralidade de sua remuneração, e não apenas uma parcela, como vem ocorrendo desde 2013. Segundo relatos de alguns que abandonaram a iniciativa e pediram asilo político em outros países, a relação deles com as autoridades cubanas é baseada na opressão, estabelecendo uma situação análoga à escravidão, em afronta aos tratados internacionais de direitos humanos, dos quais o governo brasileiro é signatário.

O ministro-relator defendeu também que os portadores de diplomas de medicina obtidos no exterior que estão no Mais Médicos deveriam ser submetidos a exames de validação de seus títulos nos moldes do Revalida. Ainda hoje, pouco se sabe sobre a qualificação dessas pessoas e seu preparo para atender pacientes. É inegável que essa situação estabelece no Brasil dois graus de cidadania: o daqueles que contam com o cuidado de médicos com diplomas reconhecidos pelas instituições de ensino nacionais e comprovaram sua capacidade por meio de testes específicos; e o dos que ficam à mercê de pessoas cujo histórico acadêmico e profissional é uma incógnita, abrindo espaço para dúvidas sobre sua eficácia.

Em relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) elaborado em 2014, supervisores contratados pelo Ministério da Saúde para dar suporte ao programa relataram que 17,7% dos intercambistas monitorados admitiram que a falta de conhecimento de protocolos clínicos conturbou diagnósticos e terapêuticas.

Pouco mais de um terço dos supervisores conta ainda que os estrangeiros enfrentavam dificuldades no dia a dia pelo desconhecimento de nomes de medicamentos e suas dosagens corretas. Em outras palavras, ao autorizar a atuação desses indivíduos, o governo e o STF permitem que a população se torne ferramenta de ensino, sem medir os riscos dessa experiência.

Infelizmente, à exceção do relator e da ministra Rosa Weber, que concordou com a posição dele, a maioria dos ministros do Supremo considerou que problemas desse tipo não eram suficientes para suspender o Mais Médicos ou, pelo menos, exigir que as autoridades o adequassem às regras legais e do bom senso. Assim permanece o programa, cuja efetividade nunca foi avaliada com instrumentos metodológicos corretos, tornando-o uma grande ação de marketing a serviço de interesses políticos e ao custo de mais de R$ 10 bilhões para Cuba nos últimos cinco anos, privando o Brasil de soma importante em tempos de crise econômica.

Como tem sido reiterado em sua crítica, o CFM age como a autarquia federal de direito público, criada pela Lei nº 3.268/57, com o objetivo de defender a boa assistência médica à população brasileira. Longe de vieses corporativistas, o Conselho cumpre seu dever de cobrar propostas de políticas públicas que se distanciem de ações paliativas.

Em lugar de trilhar esse caminho, o governo deveria investir em medidas de longo prazo, como a criação de uma carreira de Estado para o médico no Sistema Único de Saúde (SUS), projeto que ainda aguarda votação na Câmara dos Deputados. Se aprovado, estimulará os profissionais brasileiros a atuar em áreas distantes, assegurando-lhes condições para o ético e competente exercício da medicina e de atendimento à população.

Apesar de acatar o resultado da votação no STF, o CFM não se calará diante do absurdo do Mais Médicos. A autarquia mantém sua posição crítica com respeito a essa iniciativa que, desde sua origem, tem trazido riscos à saúde da população, sem agregar uma solução definitiva e estruturante para o acesso da população à assistência de qualidade, o que inclusive foi ignorado pelo Ministério Público Federal (MPF) em manifestação sobre o tema no Supremo, o que distanciou esse órgão da defesa dos interesses da cidadania, como se esperava de uma instância de fiscalização e controle.

 

* É presidente em exercício do Conselho Federal de Medicina (CFM).

 

Palavra do Presidente em Exercício publicada na edição nº 272 do Jornal Medicina. Acesse aqui a publicação.

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