Escrito por Edilma Barbosa*
Nos dias atuais, os avanços da ciência e da tecnologia são incontestáveis, os avanços estão em todas as áreas. No setor financeiro, os lucros exorbitantes muitas vezes fogem da ética. No Brasil, nas duas últimas décadas, não há praticamente nada que não tenha aumentado de preço. As tarifas públicas, como água, eletricidade e telefonia, por exemplo, foram reajustadas em mais de 500%. Os alimentos, combustíveis, medicamentos, educação, planos de saúde e serviços, de um modo geral, vêm sofrendo sucessivos aumentos de preço durante todos esses anos. Uma coisa, porém, não mudou: a Tabela de Procedimentos do SUS, que remunera o trabalho médico.
Nosso governo não se permite planejar e colocar em prática uma gestão justa e eficiente dos recursos destinados ao cumprimento de responsabilidades básicas do poder público, como oferecer segurança, educação e saúde de qualidade à população. Recursos para isso existem, mas a falta de compromisso e o desrespeito para com o cidadão impedem que eles sejam direcionados ao atendimento de suas necessidades básicas. A política posta em prática é a de honrar o compromisso de pagar os juros escorchantes da dívida externa e a de “socorrer” instituições financeiras vitimadas pelas “crises” financeiras mundiais.
Para nós, médicos, que estamos na linha de frente da assistência aos desprezados usuários do SUS, as conseqüências desastrosas e desumanas dessa política surgem com força no nosso dia-a-dia de trabalho. A escassez dos recursos destinados ao setor não permite o acesso universal, e muito menos a oferta de atendimento de saúde com qualidade à população. Nós somos mal remunerados, somos poucos para dar conta da enorme e crescente demanda, e não temos condições éticas de trabalho.
Mas nós somos fortes e temos capacidade de mudar esse cenário tão adverso. Com todas as dificuldades, somos nós que mantemos e fazemos funcionar o SUS, com nosso empenho, nossa dedicação, nossa força de trabalho e nosso sentimento de que devemos desempenhar com ética o nosso papel. Não podemos aceitar que o governo, que anda na contramão das necessidades básicas da população, continue nos submetendo e submetendo nossos pacientes ao descaso sem precedentes com que nos deparamos nos serviços públicos de saúde.
Como médicos, cada procedimento que realizamos em um doente do SUS é idêntico ao que realizamos em um paciente de Unimed, Bradesco, Unidas, Petrobras ou outros planos. Fazemos aquilo que aprendemos durante nossa formação, independente de quem estamos atendendo. E se o trabalho é o mesmo, não existe justificativa para diferenças no valor pago por esse trabalho. Se temos a CBHPM que referencia os valores pagos pelos planos de saúde, por que não levá-la para o SUS e acabar de vez com a vergonhosa distorção dessa tabela oficial que escraviza o médico e desvaloriza o nosso trabalho?
O governo discrimina os pacientes do SUS, oferecendo saúde sem qualidade. A Tabela SUS não é reajustada há mais de uma década, o que fez com que muitos médicos credenciados desistissem de trabalhar para o SUS, o que resultou em grande prejuízo para os usuários do sistema. Os que continuam integram um contingente insuficiente para dar conta da demanda. Desestruturada, carente de recursos humanos, principalmente de médicos, os serviços públicos de saúde vivem superlotados. Há longas filas de espera para tudo: consultas, exames, cirurgias, tratamentos diversos. E há uma interminável lista de pessoas morrendo nessas filas.
Apesar disso, o governo não tem interesse em reverter essa situação, e nem se envergonha da situação caótica da saúde pública no país. Do contrário, não haveria tanto descaso; os recursos da saúde iriam de fato para o setor; os programas teriam financiamento garantido e a população, cuidada por um serviço de saúde básica bem estruturado, adoeceria menos. A realidade seria outra.
Cabe a nós, médicos, usarmos nossa força para pressionar os gestores e mobilizar a sociedade para que ocorram mudanças. A saúde é obrigação do Estado e direito de todos. Nós trabalhamos com zelo, cumprimos com nossas responsabilidades e atuamos eticamente. Temos o direito de cobrar uma remuneração digna no SUS.
As entidades médicas brasileiras estabeleceram como padrão de pagamento justo pelo trabalho médico a CBHPM. Lutamos para implantá-la nos planos de saúde, e vencemos. Podemos vencer esse embate também com o governo.
Conclamamos a todos os médicos brasileiros que se unam, de Norte a Sul, por um único objetivo: implantar a CBHPM no SUS, por remuneração justa, valorização do trabalho médico e Medicina de qualidade para a população.
* É conselheira federal representante de Alagoas.
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