Anastácio Kotzias Neto*
A prática da medicina desperta curiosidade, opiniões diversas e eventualmente discussões. A busca constante por aprimoramento científico pelo médico e a evolução tecnológica na oferta de insumos eficazes na assistência a milhares de pacientes proporcionaram aumento da qualidade e expectativa de vida.
Pela sua importância e necessidade social, é destaque na mídia, trazendo ao debate, por vezes acalorado, as posturas em que os atores se veem envolvidos nas mais diferentes circunstâncias. É necessária e muito oportuna esta abordagem desde que focada na orientação e bem comum.
Inúmeras são as observações a respeito da prática médica. A divulgação de novas descobertas oferece ao leitor a possibilidade de tratar-se com o que lhe apresentam como o “mais moderno”, entretanto são estudos experimentais não disponíveis no nosso meio, e sem ter cumprido os requisitos mínimos de segurança e aplicabilidade determinados pelos órgãos competentes (CEP, Conep, Anvisa).
A evolução guarda relação estreita com a indústria, seja ela farmacêutica ou de insumos, composta por empresas estruturadas, que têm o segundo orçamento de investimento e lucro e veem o mercado como resultado de seus investimentos e pesquisas. Dados do MS/ANS revelam que a implantação de órteses e próteses custaram ao SUS em 2017 R$ 1,25 bilhão. São utilizados em procedimentos cardiológicos e ortopédicos 400 tipos de próteses e órteses. O mercado nacional de dispositivos implantáveis no ano gastou R$ 4 bilhões, e o de órteses e próteses, R$ 20 bilhões.
No âmbito do exercício da medicina, o problema decorre do conflito de interesses estabelecido quando o médico recebe vantagens diretas e/ou indiretas para prescrever determinados produtos, sendo imperativa a necessidade de coibir abusos e irregularidades na prescrição e comércio de órteses, próteses e materiais especiais (OPMEs).
Os Conselhos de Medicina – em especial o CFM –, atentos ao problema, têm exigido do governo e dos planos de saúde condições de trabalho e remuneração justa e digna para os médicos. É preciso melhorar os honorários médicos e os valores pagos pela Tabela SUS e pelas operadoras de planos de saúde. Essas medidas contribuem para fortalecer o médico contra os avanços de representantes antiéticos da indústria de medicamentos e implantes. Isso evitará denúncias envolvendo representantes da indústria, donos e funcionários de hospitais e médicos.
O I Fórum de Ortopedia e Traumatologia, realizado pela Câmara Técnica de OT do CFM em outubro, reuniu os envolvidos neste cenário para discutir sobre compliance na visão dos Instituto Ética Saúde, Ortopedista e Conselho Federal de Medicina. Temas como “Segunda opinião: solução ou conflito?”, com palestras da Sociedade Brasileira de Coluna e do CFM, e “Material de implante: a quem cabe a escolha?”, com exposições da SBOT, da Anvisa, Operadoras e Ministério da Saúde, justificaram a realização do evento que contou com um plenário repleto e participativo.
Pelo apresentado e discutido, podemos concluir que, mesmo disponíveis e interessados, somos pouco ouvidos pelos órgãos responsáveis pelo controle e liberação dos insumos que utilizamos, motivo da nossa insistência enquanto órgão fiscalizador, agora em parceria com a SBOT.
Temos a convicção de que o combate às irregularidades na prescrição e comércio de OPMEs depende de uma ação coordenada envolvendo diferentes segmentos da sociedade. A criação de um escopo legal e de esferas para fixação de valores para os produtos será importante auxiliar para coibir as irregularidades.
Os Conselhos de Medicina estão comprometidos com a defesa da ética no exercício profissional e continuarão a colaborar com as investigações relacionadas às denúncias, na fiscalização de casos suspeitos e na formulação de regras que reforcem as boas práticas em benefício do paciente e respeito ao médico que desempenha seu mister com dedicação e esmero.
* É doutor em Ortopedia e Traumatologia. No CFM, representa os médicos de Santa Catarina.
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