Na primeira manhã de debates do XI Congresso Brasileiro de Direito Médico, o subprocurador-geral da República Humberto Jacques de Medeiros proferiu a conferência de abertura trazendo debates contemporâneos sobre judicialização da saúde.

O subprocurador destacou o investimento na medicina defensiva para proteção jurídica do médico

“O maior preço que o Direito cobra em troca de segurança é a liberdade, a autonomia. A relação entre Medicina e Direito é uma relação farmacológica, pois, pode ser um remédio ou um veneno, se essa relação não for bem administrada e estrategicamente concebida”, alertou Humberto Jacques.

“Na prática médica, começa-se a ver imperativos que não são técnicos nem éticos e, em certos casos, se contrapõem a estes”, afirmou o subprocurador, que afirma ser exatamente esse o plano de fundo do problema. Nessa linha, o conferencista questionou: “quanto se gasta na medicina defensiva, não porque é necessária sua realização, mas por proteção do médico frente ao Direito? Esse é um dos efeitos da iatrogenia do Direito e há que se avaliar o que se deve levar para deliberação no Direito e no Judiciário, deve-se ter cautela e o caminho pode estar nos princípios bioéticos”.
A presidente do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (FONAJUS), Daiane Nogueira de Lira, destacou que a judicialização da saúde é o sintoma de um problema e é cabível, pois a Constituição garante acesso universal à saúde. “O Judiciário não age de ofício, ele é provocado a decidir e hoje as ações de saúde são prioritárias”, afirmou, salientando que uma decisão de saúde não repercute apenas no demandante, mas, pode impactar em filas, tratamentos e nos sistemas de saúde.

Advogada da União e membro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Daiane de Lira destacou que, “em cinco anos, contabilizamos mais de 2 milhões de processos de acesso à saúde e hoje há mais de 800 mil processos judiciais de acesso à saúde tramitando sendo que, somente em 2024, o Poder Judiciário já julgou e baixou 273 mil processos”.
Pontuando que o Judiciário não tem as informações que precisa para decidir, a conselheira do CNJ apontou que, considerando que “o Direito à saúde vive uma epidemia de litigiosidade”, há instâncias para subsidiar os magistrados em suas decisões, como os Comitês de Saúde, o NAT-JUS, que é o FONAJUS, que reúne entes dos sistemas de justiça e de saúde para formação de políticas públicas judiciárias que garantam o direito à saúde a partir de diálogo, da cooperação e da mediação.

Por sua vez, a juíza Ana Cláudia de Barros Correia abordou a responsabilidade civil e material na prestação de serviços de saúde e destacou que, “há três anos, a obstetrícia liderava os processos abertos por danos causados à saúde”. Segundo ela, hoje, a cirurgia estética lidera as demandas judiciais dentre os procedimentos mais litigados, seguida por procedimentos ortopédicos e obstetrícia, alertando que a informação prestada ao paciente deve ser clara e detalhada, pois, a publicidade gera dano moral e até material.

Com base em informações sobre o novo código civil, que tramita no Congresso Nacional e prevê artigos com responsabilidades específicas para médicos, hospitais e planos de saúde, a magistrada afirmou que essas são “áreas em que dificilmente há conciliação em termos de danos materiais por parte dos prestadores de serviços”.

De acordo com sua visão, para se reduzir litígios de responsabilidade civil, é necessário focar na qualificação técnica. A juíza parabenizou o CFM pelo trabalho que tenta barrar abertura indiscriminada de escolas médicas e recomenda elaborar cuidadosamente o termo consentimento livre e esclarecido, assim como dialogar com o paciente.

ATO MÉDICO – A primeira manhã de debates do XI Congresso Brasileiro de Direito Médico debateu ainda a invasão do ato médico por profissionais não habilitados. À frente da Delegacia Estadual de Repressão a Crimes contra o Consumidor em Goiás, a delegada Débora Melo chamou atenção para a gravidade dos atos que atentam contra a saúde pública, materializados no número crescente de casos registrados na Polícia Civil.

“A maior parte dos casos está relacionada a procedimentos estéticos invasivos realizados por profissionais não-médicos e, no contexto de redes sociais. Há uma desinformação absurda tanto quanto à competência do profissional quanto aos riscos dos procedimentos. Crimes contra a saúde pública são investigações complexas, pois envolvem aspectos técnicos e que também passam, por exemplo, por Direito Médico, Direito Sanitário e Direito do Consumidor”, disse.

Na Bahia, o Conselho Regional de Medicina (Cremeb) tem, desde 2019, uma comissão dedicada à defesa do ato médico que oferece ao médico condições para denunciar quais medidas que impeçam o médico de exercer seu trabalho com ética. A partir de sua criação, esse grupo já recebeu 453 demandas e realizou 341 audiências, tendo 70% das decisões favoráveis.

“Permitir que o médico exerça sua profissão e impedir que outros invadam a medicina. Nesse trabalho, o nosso maior aliado é o médico, que denuncia com garantia de anonimato. O Cremeb age em todas as instâncias, inclusive judicialmente contra a pessoa física contratante do médico pessoa jurídica”, afirmou Otavio Marambaia, presidente do Cremeb.

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