Escrito por Edson de Oliveira Andrade* e José Luiz Gomes do Amaral**
Acusam-nos os médicos de omissão. Acusam-nos os médicos de faltarmos à assistência de nossos pacientes.
Vemo-nos mais uma vez usados para ocultar a incompetência e a omissão de gestores que, movidos por inconfessáveis interesses pessoais, têm tratado a Saúde e a população não assistida como objeto de negociação rasteira e politicagem.
A crise que ora se manifesta aguda no Nordeste brasileiro é já antiga e também não é de hoje que a classe médica tem se manifestado contra o descaso com que a questão da Saúde é tratada.
Já nos idos 90, o médico e ministro Adib Jatene lançou-se em cruzada defendendo a criação da CPMF, imposto a ser aplicado exclusivamente no financiamento do Sistema Único de Saúde. Apoiaram-no os médicos e toda a sociedade brasileira. Bem-intencionada proposta do ministro foi desfigurada, o imposto a princípio provisório é tornado virtualmente definitivo e, fruto de conspiração imoral, os recursos adicionais obtidos são desviados para propósitos estranhos à iniciativa original.
Idêntica batalha foi travada a partir do ano 2000, protagonizada, entre tantos outros, pelo médico Eduardo Jorge. Também com o apoio dos médicos e de toda a sociedade, logrou-se aprovar a Emenda Constitucional 29. Do orçamento aprovado sucedem-se governantes a subtrair-lhe recursos, igualmente desviados para fins espúrios.
O orçamento cresce, mas a remuneração relativa à prestação do serviço – vide a tabela do SUS – resta imutável. Miserável. Caem filantrópicas e Santas Casas em estado falimentar. Desinteressam-se os profissionais da saúde pela carreira pública.
Os inconformados reúnem-se em movimento destinado a regulamentar a Emenda Constitucional 29, tentativa de remover os subterfúgios que os astutos administradores têm usado para descaracterizar do espírito da lei. Foi o médico Roberto Gouveia que, no primeiro ato de sua legislatura, apresentou com esta finalidade o Projeto de Lei Complementar 01/2003. São novamente, da Frente Parlamentar da Saúde, os médicos Rafael Guerra e Darcísio Perondi que, apoiados por legião de parlamentares, entidades representativas da área da Saúde, sempre entre elas os médicos, vêm em defesa deste regramento.
São os médicos pernambucanos que, vencidos pela cínica contemporização dos gestores, decidem ontem pela demissão do Serviço Público. Em João Pessoa, foram as autoridades de Saúde prevenidas reiteradamente da intenção de não mais submeterem-se seus especialistas ao desrespeitoso tratamento que lhes era concedido. Em Alagoas, não acreditaram que os famintos profissionais de saúde e entre eles, naturalmente, os médicos, recusassem as migalhas que lhes deixavam cair ao chão.
Disseram-lhes, a eles e não à população sofrida, basta!
Em ação voluntária, desprendida e benemerente atenderão os médicos gratuitamente quem os procurar. Renunciarão, contudo, ao tratamento vil explicitado nas vergonhosas tabelas e contratos vazios que se lhes tem sido apresentados.
Não, os médicos não abandonaram seu povo. Nunca recusarão atendê-los. Negar-se-ão, porém, e por certo, a servir esses burocratas que malversam os pesados tributos arrancados da nossa repetidamente ludibriada sociedade brasileira.
* É presidente do Conselho Federal de Medicina
** É presidente da Associação Médica Brasileira
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