Escrito por Alfredo Guarischi*
Nove horas da manhã de um lindo dia, na praia de Copacabana. Céu, mar e sete personagens fizeram parte desta experiência. Não houve público. Os carros que passaram, não pararam. Sempre são muitos nesta hora da manhã. Quem andava na calçada, seguiu seu caminho. Todos têm pressa.
Em busca de melhor condição cardiovascular fazia minha caminhada, junto à praia. Atravessei a Avenida para voltar para casa. Na calçada oposta três mulheres, sendo a mais idosa com 84 anos, pareciam tentar dominar uma cadeira de rodas irrequieta. Ao me aproximar vejo a senhora lívida, cabeça pendida. Não respirava. Pele gélida, num sol escaldante. Vou direto ao seu pescoço em busca de alguma pulsação. Nada. Estava em parada cardíaca.
Comecei massagear seu peito ainda na cadeira. Logo em seguida, com ajuda das duas mulheres perplexas, coloco- a no chão. Peço a uma delas que chame por mais ajuda. Dois porteiros chegam e mostram sua eficiência. Peço a outra mulher que chamar os bombeiros. Um dos porteiros, a meu pedido, levanta as pernas da minha paciente – eu era seu médico neste momento. Com esta manobra mais sangue chega ao cérebro. O outro porteiro, do prédio da paciente, entra em contato com a família.
Foi um longo minuto até haver a primeira reação de minha paciente. Um som surdo. Mais massagem. Os olhos começam a viver. Mais um som. Mais massagem. Enfim retornou a vida. Sua primeira palavra era para saber se estava bem.
A ambulância dos Bombeiros não chega. Peço nova ligação. Explico ao atendente o quadro e recebo a informação que a ambulância estava chegando. Minha ansiedade foi mais longa que o tempo que a equipe de socorristas levou para chegar.
Neste momento a senhora já estava bem. Lúcida. Chega à família e relatam que aquele quadro havia ocorrido antes. Não houve necessidade de massagem. “Aquele quadro?” A conversa se perde. Fica a pergunta de como teria sido um eletrocardiograma no chão de Copacabana. Pouco importa, pensei, não respirava e não havia pulsação. Não ando com aparelho de eletrocardiograma no calção.
Há duas semanas havia realizado um Curso de Reanimação Cardíaca. Liguei para meu instrutor para relatar o ocorrido e agradecer os ensinamentos. Médicos devem estudar todos os dias. Somos testados a todo momento. Neste dia de sol fui novamente testado. Meu coração está feliz, mesmo que haja dúvida que o outro nunca tenha parado. Os sete personagens desta história apenas condenamos os que passaram e não pararam. Teriam visto a beleza do sorriso de minha paciente e a solidariedade do trabalho em equipe.
* É Cirurgião, membro da Câmara Técnica de Oncologia do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj)
alfredoguarischi@yahoo.com.br
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