Escrito por Antonio Carlos Lopes*
Eternos campeões de reclamação nos órgãos de defesa do consumidor, os planos de saúde continuam a protagonizar cenas de desrespeito em relação aos médicos e pacientes. Não são todos, naturalmente. Porém, boa parte deles abusa de práticas que visam apenas a amealhar lucro em detrimento da boa assistência aos cidadãos.
Não é de hoje, aliás, que os planos tomam os médicos como vítima preferencial. Isso porque a Lei 9656, de 1998, fechou algumas portas que possibilitavam o ataque direto aos pacientes, mas não normatizou adequadamente a relação com os prestadores de serviço. Resultado: operadoras pressionam os profissionais de medicina com as mais variadas estratégias para reduzir exames, internações e a solicitação de procedimentos diversos.
Não importa, para certos planos, se as solicitações são fundamentais para um tratamento correto e até para salvar vidas. Quando cifras estão em jogo, diversas empresas tentam solapar a autonomia do médico e ignoram as necessidades de seus usuários.
Frequentemente, os planos de saúde forçam altas hospitalares precoces, pressionam a transferência dos pacientes para hospitais de retaguarda e questionam terapêuticas, em claro gesto de força e desumanidade. Pouco importa a eles se o médico, que acompanha seu paciente há muitos anos, ficar desvinculado do tratamento. Além disso, também transferem todo o poder a auditores que tomam decisões com base em guias frias, prontuários e números, como se esses dados representassem o doente.
No que diz respeito ao tratamento domiciliar (home care), os planos de saúde igualmente deixam a desejar. Os profissionais, quase sempre pouco qualificados, passam a dar atendimento ao doente em casa, quando estes poderiam receber melhor tratamento no hospital. Mais uma vez, o médico titular vai sendo progressivamente afastado de seu antigo paciente.
Lamentável é saber que, a despeito do caos do setor ser público, não existe vontade política para enfrentar esse problema. Entidades médicas e de defesa do consumidor há anos denunciam sistematicamente tais abusos, contudo, a situação só se agrava ano a ano.
É fundamental que toda a sociedade se mobilize para fazer frente ao desrespeito de certas empresas contra profissionais de medicina, contra pacientes e, em última análise, contra o direito constitucional que temos, a uma saúde integral, universal e de qualidade.
Um bom começo é exigir revisão completa da Lei 9656, de forma a acabar com as lacunas que transformam médicos e usuários em presas dos maus empresários do setor.
* É presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM).
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