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Conselho Federal de Medicina

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Escrito por Francis Kashima


PARECER CRM/AC Nº. 001/2010

PROCESSO CONSULTA N. º 009/2009 – PROTOCOLO N. º 3645/2007

ASSUNTO: Exercício Profissional dos Peritos Médicos Previdenciários

PARECERISTA: CONS. Francis Kashima

EMENTA: A determinação do número de consulta por período e por especialidade não é da competência de nenhum órgão ou instituição. É direito do médico exigir condições de trabalho dignas.

CONSULTA Trata-se de documento protocolado neste Conselho em 28 de setembro de 2009, assinado pelo médico Rodrigo Prado Santiago, Delegado da Associação Nacional dos Médicos Peritos do Acre, solicitando parecer técnico a respeito de questões levantadas por Benedito Adalberto Brunca, Diretor de Benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social, no Memorando-Circular n.º 87 INSS/DIRBEN, datado em 19 de dezembro de 2007 e dirigido aos gerentes Regionais, Gerentes Executivos, Chefes de Divisão/Serviços de Benefícios, Chefes de Serviço/Seção de GBENIN e Chefes de Agências da Previdência Social – APS, definindo, dentre outros assuntos, o quantitativo diário de exame médico pericial. O questionamento principal tem a ver com a definição pelo gestor de quantitativo diário de perícias médicas que os Peritos Médicos do quadro de pessoal do INSS devem efetivar durante a jornada de trabalho de 24 horas semanais, bem como a criação de um sistema de pontuação que atribui valores a cada atividade médica realizada pelo médico perito. Para fins de aferição de produtividade.

O médico consulente questiona a determinação administrativa por considerá-la incompetente para normatizar assuntos médicos e condutas éticas. Conclui sua solicitação expondo que o INSS viola os artigos 8º e 16, bem como pareceres do CFM sobre cronometragem de atendimento médico e a utilização do SABI como limitador da atividade médico-pericial. Em tempo, acrescenta sobre a escassez de salas de consultórios médicos em desconformidade com as normas da ANVISA e das próprias exigências impostas pela Diretoria de Atendimento (DIRAT) do INSS. Baseado nesse panorama solicita emissão de parecer com o objetivo de se determinar:

a) se é possível a limitação temporal das perícias realizadas no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social;

b) em caso afirmativo à questão do item a, se é suficiente o tempo de 20 minutos para a realização de perícia médica detalhada, bem fundamentada e compatível com os preceitos éticos e profissionais do exercício da medicina;

c) se a realização de 24 perícias diárias pelos Peritos Médicos Previdenciários possibilita a realização de perícias igualmente compatíveis com os ditames éticos, além da emissão de laudos qualificados e o aprofundamento no estudo dos casos com os quais se deparam esses servidores;

d) se é possível a imposição, por meio de sistemas eletrônicos, de restrições ao laudo médico pericial, seja no número de páginas e caracteres ou nos CID disponíveis, bem como a determinação automática de que determinados CID não dão direito aos benefícios pleiteados;

e) se o INSS deve fornecer meios físicos ou eletrônicos que possibilite ao Perito Médico anexar aos laudos médico-periciais cópias de exames clínicos e laudos médicos quando pertinente;

f) se o Perito Médico Previdenciário é obrigado a trabalhar em consultórios que não estão em conformidade com os dispositivos sanitários previstos em lei e se ele pode ser punido administrativamente caso se recuse a exercer ato médico em ambiente comprovadamente inadequado ao exercício da medicina.

FUNDAMENTAÇÃO E PARECER

Para fundamentar posterior conclusão, impende firmar alguns postulados, a saber:

a) O exame médico-pericial com finalidades previdenciárias constitui ato médico. Ato complexo que, além de conhecimento técnico multidisciplinar, demanda conhecimento da legislação trabalhista e de normas da Previdência Social que regulam a matéria. O ato pericial implica a realização de anamnese e de exame físico adequados; análise de atestados e exames complementares; pesquisa de antecedentes laborais e previdenciários; análise da legislação adequada ao caso e, ainda, a eventual análise das condições atuais de trabalho, sem esquecer que tudo isto deve ser executado dentro de contexto de acolhimento humanístico do segurado, nessa ocasião portador de grandes expectativas quanto ao seu pleito;

b) O exame médico-pericial no âmbito da Previdência Social tem por objetivo emitir um laudo técnico (parecer) que servirá para embasar a decisão final de concessão ou não de benéfico;

c) Para o bom exercício da medicina faz-se imprescindível que o médico disponha de boas condições de trabalho e receba justa remuneração, e

d) A atividade realizada pelo perito médico é regida pelo Código de Ética Médica (CEM);

Esses paradigmas são resultantes de dispositivos contidos na legislação vigente e no Código de Ética Médica, transcritos a seguir:

Competência Legal dos Conselhos para legislar sobre ética médica:

Lei 3.268/57

Art. 2º O Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Medicina são os órgãos supervisores da ética profissional, em toda a República¸ e ao mesmo tempo, julgadores e disciplinadores da classe médica, cabendo-lhes zelar e trabalhar por todos os meios ao seu alcance, pelo perfeito desempenho ético da medicina e pelo prestígio e bom conceito da profissão e dos que a exerçam legalmente.

Art. 5º – São atribuições do Conselho Federal: a) ~

c) ………………..

d) Votar e alterar o Código de Deontologia Médica, ouvidos os Conselhos Regionais;

Art. 15 . São atribuições dos Conselhos Regionais:

a) ~

b) ………..

c) Fiscalizar o exercício da profissão de médico; d) Conhecer, apreciar e decidir os assuntos atinentes à ética profissional, impondo as penalidades que couberem.

Art. 17 – Os médicos só poderão exercer legalmente a medicina em qualquer de seus ramos ou especialidades, após o prévio registro de seus títulos, diplomas, certificados ou cartas no Ministério da Educação e Cultura e de sua inscrição no Conselho Regional de Medicina, sob cuja jurisdição se achar o local de sua atividade.

Art. 18. Aos profissionais registrados de acordo com esta Lei será entregue uma carteira profissional que os habilitará ao exercício da medicina em todo o País.

Do anotado, inicialmente se conclui que compete aos Conselhos de Medicina a fiscalização do exercício ético dessa profissão. O exercício ético da medicina encontra-se definido no Código de Ética Médica, onde são descritas as normas fundamentais que regulamentam a atuação individual ou coletiva do médico.

Também ficou claro que médico regularmente inscrito em Conselho Regional de Medicina pode praticar todos os atos próprios da profissão, de vez que conta com competência jurídica, a qual não pode ser restringida por quem não possui poder legal para tanto.

Isto posto, com relação à autonomia do médico, vale a pena destacar:

Código de Ética Médica – Resolução CFM 1.246/1988

Art. 2° – O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional. (grifo nosso)

Art. 4° – Ao médico cabe zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho ético da Medicina e pelo prestígio e bom conceito da profissão.

Art. 8° – O médico não pode, em qualquer circunstância, ou sob qualquer pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, devendo evitar que quaisquer restrições ou imposições possam prejudicar a eficácia e correção de seu trabalho.

Art. 27 – É direto do Médico: dedicar ao paciente, quando trabalhar com relação de emprego, o tempo que sua experiência e capacidade profissional recomendarem para o desempenho de sua atividade, evitando que o acúmulo de encargos ou de consultas prejudique o paciente.

Código de Ética Médica _ Resolução CFM 1.931/2009

Princípios Fundamentais:

I …

II – O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional.

IV – Ao médico cabe zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho ético da Medicina, bem como pelo prestígio e bom conceito da profissão.

VII – O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência…

VIII – O médico não pode, em nenhuma circunstância ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a correção de seu trabalho.

XVI – Nenhuma disposição estatutária ou regimental de hospital ou de instituição pública ou privada limitará a escolha, pelo médico, dos meios cientificamente reconhecidos a serem praticados para o estabelecimento de diagnóstico e de execução de tratamento, salvo quando em benefício do paciente.


Direitos do Médico

VII – Decidir, em qualquer circunstância, levando em consideração sua experiência e capacidade profissional, o tempo a ser dedicado ao paciente, evitando que o acúmulo de encargos ou de consultas venha a prejudicá-lo.


Responsabilidade Profissional

Art. 98 – É vedado ao médico: Deixar de atuar com absoluta isenção quando designado para servir como perito ou auditor, bem como ultrapassar os limites de suas atribuições e de sua competência.

A doutrina e jurisprudência ética são volumosas na reiteração dos enunciados acima, destacando, dentre outros o Parecer Consulta CFM no. 30/1990, assim ementado:

“Não deve ser da competência de nenhum órgão ou entidade a determinação do número de atendimentos médicos para qualquer carga horária em qualquer especialidade”

Dessa forma, fica claro que nenhuma instituição poderá determinar ou limitar o tempo da consulta médica, porquanto a complexidade da execução de um ato pericial, certamente mais abrangente que uma consulta médica de rotina, exige a plena autonomia do profissional na determinação do tempo e mecanismos que precise para formatar um laudo pericial médico, ético e ajustado ao caso em estudo.

O médico na função de perito não deve aceitar qualquer tipo de constrangimento ou restrição que possa influir no desempenho de sua atividade, a qual deve ser realizada com absoluta isenção, imparcialidade e autonomia, razão pela qual não pode ser estabelecido tempo fixo para a realização desse ato médico-pericial.

Já os questionamentos contidos nos parágrafos e) e f) da consulta são muito bem elucidados pelos artigos 23 e 24 do CEM: É direito do médico:

Art. 23 – Recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar o paciente.

Art. 24 – Suspender suas atividades, individual ou coletivamente, quando a instituição pública ou privada para a qual trabalhe não oferecer condições mínimas para o exercício profissional ou não o remunerar condignamente, ressalvadas as situações de urgência e emergência, devendo comunicar imediatamente sua decisão ao Conselho Regional de Medicina.

Assim, afirmamos que o médico tem direito de recusar-se a trabalhar em unidades que não ofereçam condições mínimas para o exercício de sua atividade, com ética e dignidade, ressaltando que o bem estar do paciente está acima de tudo.

Neste caso é dever do médico “Apontar falhas nos regulamentos e normas das instituições em que trabalhe, quando as julgar indignas do exercício da profissão ou prejudiciais ao paciente, devendo dirigir-se, nesses casos, aos órgãos competentes e, obrigatoriamente, à Comissão de Ética e ao Conselho Regional de Medicina de sua jurisdição” (art. 22 – CEM).

É o parecer, s. m. j.

Rio Branco, 23 de fevereiro de 2010.

Cons. FRANCIS KASHIMA

Parecerista

* É conselheiro federal.

* As opiniões, comentários e abordagens incluidas nos artigos publicados nesta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do Conselho Federal de Medicina (CFM).


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