Mauro Luiz de Britto Ribeiro*
SIM
A telemedicina foi implantada com sucesso em países desenvolvidos para atender a locais remotos ou de difícil provimento, sendo inimaginável planejar políticas de saúde sem esse instrumento.
O Conselho Federal de Medicina, com outorga legal para normatizar a medicina no Brasil, publicou a resolução nº 2.227/18, prevista para entrar em vigor em três meses. No período, o CFM envolverá médicos e outros segmentos em seu aperfeiçoamento, e uma consulta pública já foi aberta para contribuições.
Com a resolução, espera-se oferecer aos brasileiros instrumento semelhante ao de países desenvolvidos. Será um divisor de águas na medicina do Brasil ao normatizar a telecirurgia e reconhecer a teleconsulta no suporte ao atendimento presencial do médico.
Houve reações à norma. As críticas têm sido analisadas pelo CFM, em sua maioria dissociadas do seu fulcro. Inúmeras publicações foram feitas com acusações de falta de transparência na elaboração do documento; associação de conselheiros com partidos políticos; e interesses espúrios articulados com grupos privados. Tais colocações não contribuem com o aperfeiçoamento do documento e são totalmente fora de propósito.
No entanto, há críticas pertinentes sobre três pontos: definição de área remota, custo de implantação do sistema e condições em que a teleconsulta é permitida.
Em relação ao conceito de remoto, a resolução se refere às áreas distantes, com municípios hipossuficientes, como na Amazônia ou sertão nordestino. Para o CFM, esse ponto deve ser realmente mais bem esclarecido.
Sobre os custos, fala-se de valores de implantação da telemedicina nos consultórios muito superiores aos reais e ignora-se que a certificação digital nível NGS 2, citada no documento, atende a uma exigência legal.
Com respeito à teleconsulta, a norma fixa que ela pode ser feita em qualquer localidade, desde que com a concordância do paciente e após primeira consulta presencial obrigatória.
Os atendimentos à distância ocorrerão em, no máximo, 120 dias, quando se exige nova consulta presencial com o mesmo médico.
Em regiões remotas, e apenas nessa condição, a resolução permite que a primeira consulta seja de modo virtual, com presença do médico numa ponta e paciente na outra, acompanhado por profissional de saúde. Isso permite ao cidadão desassistido acesso ao médico, poupando-o de ir a outra localidade.
Deve-se enfatizar que o papel do profissional de saúde a auxiliar o médico nesse tipo de teleconsulta é igual ao do que está em consultórios ou hospitais. Atuará para a consulta ser realizada de forma plena e posteriormente orientará o paciente conforme as determinações do médico.
Ressalte-se: o profissional de saúde na região remota não formulará hipótese diagnóstica nem prescreverá tratamento, que são atos de responsabilidade do médico.
O mundo se desenvolve tecnologicamente de maneira nunca vista na história. A medicina é uma das áreas preferenciais desse desenvolvimento, o que nos tira da zona de conforto e exige a reformulação de conceitos.
Gostemos ou não, a telemedicina já é realidade no país, feita atualmente de maneira desregrada, atendendo a grupos privados, com interesses econômicos.
Cabe ao CFM regulamentar a telemedicina, sem receio de a tecnologia interferir na relação de confiança médico-paciente, pilar sagrado da medicina, que independe de encontro presencial.
* É primeiro vice-presidente do Conselho Federal de Medicina.
Artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, em 16/02/2019.