Escrito por Rogério Wolf de Aguiar*
“Nesta semana a média de idade da UTI diminuiu 40 anos”, comentou, consternado, um dos atendentes de uma das UTIs de um dos hospitais de Santa Maria. Todos os enfermos, de qualquer idade, merecem toda a atenção. Mas a ocupação maciça e súbita por tantos jovens é absolutamente chocante. E é uma das características mais marcantes do que aconteceu, do que está acontecendo e do que vai acontecer na comunidade local e que se estende por todo o Estado, o País e até no mundo inteiro.
No dia 31 de janeiro, junto com o diretor Ismael Maguilnik, o delegado seccional Floriano Soeiro de Souza Neto e os conselheiros Léris Haeffner e João Alberto Larangeira, visitamos o Hospital de Caridade, o Universitário da UFSM, a Casa de Saúde (em suas UTI e Emergências) e a UPA, em Santa Maria. Constatamos de maneira muito viva e forte, visualmente e pelos relatos das equipes médicas, todo o esforço físico e emocional realizado desde os primeiros atendimentos na noite da catástrofe. Os dirigentes médicos dos hospitais não tiveram tempo de convocar aqueles que não estavam de plantão. Muito rapidamente acorreram em grande número, assim que a dimensão do acontecimento ficou conhecida, logo em seguida.
Médicos, demais profissionais da saúde, funcionários administrativos, da limpeza, se mobilizaram. O transporte de pessoas feridas, feito por ambulâncias, taxistas, particulares e outros, superlotou a entrada dos hospitais. No ambiente de desespero e dor, com muitos gravemente atingidos, na ameaça do caos, alguns se destacaram, não só pelo conhecimento técnico, mas por terem organizado de maneira muito eficiente a atenção ao grande número de necessitados. Saímos de lá convencidos de que a presteza e a capacidade de socorrer, de colocar a ventilação mecânica e encaminhar para o suporte imediato foram vitais para diminuir o número de vítimas fatais.
Como o problema principal da maioria foi agressão às vias aéreas por parte da fumaça envenenada, a ventilação mecânica imediata proporcionou a condição necessária para a sobrevivência de muitos.
Quando os reforços externos chegaram, a presença do apoio da força nacional, que foi fundamental também, a contribuição extraordinária da Força Aérea para a remoção dos pacientes para Porto Alegre, abrindo espaço nas UTIs de Santa Maria para que outros pudessem ser atendidos, encontraram muitos salvos pela grande capacidade técnica e de ação sob forte pressão dos médicos locais que atenderam nos primeiros e decisivos momentos.
Não deveria ter ocorrido o que ocorreu na boate, mas poderia ter sido bem pior do que foi. Ainda há muito por fazer. As consequências físicas e emocionais ainda precisarão de muitos esforços para ser enfrentadas. A rede de solidariedade está fazendo tudo para dar certo. Mas não dá para esquecer que houve muita competência, doação e dedicação nos primeiros passos de todo este processo.
* É presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers).
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