Escrito por Marco Aurelio Smith Filgueiras*
Além das medidas já sobejamente conhecidas da Secretaria de Educação Superior (SESU) do Ministério da Educação (MEC), tais como a abertura de novas escolas médicas e o aumento de vagas nas já existentes com as alegações de que “está faltando medico no Brasil” e “precisamos de mais médicos para interiorizar a medicina no País” estamos trazendo à discussão um velho problema relacionado ao ensino medico que tem muito nos preocupado já há algum tempo e que merece a atenção dos órgãos responsáveis pela educação deste país.
Estamos nos referindo à deficiência na grade curricular das escolas ou faculdades de medicina públicas ou privadas da disciplina de Farmacologia Clinica e Terapêutica. Estas matérias apesar de sempre existirem na estrutura curricular nunca atenderam aos anseios, às necessidades do estudante de Medicina, da classe médica como um todo e da população brasileira. Por esta razão, os médicos de ontem não foram e os de hoje não estão preparados convenientemente para o exercício profissional do nobre oficio de prescrever um medicamento, de medicar seu paciente ao final de uma consulta. Temos que confessar: o treinamento, os erros cometidos sem tentar repeti-los é lógico, a vida prática, enfim a experiência profissional foram nossos professores.
Acreditamos que este problema vigora desde os primórdios do ensino medico no Brasil quem sabe até desde a fundação na Bahia da primeira Faculdade de Medicina, em 18 de fevereiro de 1808, portanto há 204 anos.
A Farmacologia Clinica e Terapêutica evoluíram com a necessidade de se comprovar a eficiência e segurança dos fármacos em seres humanos, em função das leis que regulamentavam o desenvolvimento, produção e comercialização dos medicamentos. Atualmente é a expressão contemporânea do emprego do método cientifico para a racionalização da terapêutica medicamentosa. E como acabamos de dizer, profissionais da área de saúde, particularmente os médicos, nunca receberam a devida qualificação durante sua formação acadêmica.
Senhores, isto quer dizer que o medico sempre concluiu seu curso sem saber realmente o que é medicamento e assim sendo nunca teve segurança na hora de prescrevê-lo. O que aprendeu (pelo menos posso dizer que aprendemos assim) foi com os propagandistas de laboratório que circulavam pelos corredores das faculdades e o assediava constantemente nos intervalos das aulas ou na saída, oferecendo amostras-grátis e divulgando apenas os benefícios dos seus produtos farmacêuticos. Claro que os malefícios não eram relatados e em contrapartida nossos professores não nos alertavam para esses riscos. Este quadro continua nos dias atuais e com mais intensidade.
Por esta razão a polifarmacoterapia ou prescrição excessiva e desordenada de fármacos prosperou e há muito se alastra no seio da nossa categoria atingindo em cheio a sociedade brasileira e até mesmo a população mundial, assolando-a e criando um numero elevado de doenças iatrogênicas ou provocadas pelo próprio tratamento medico e que têm conduzido muita gente para o leito da morte. Temos uma frase que explicita muito bem a capacitação do esculápio, na ocasião de prescrever um medicamento e que serviu de titulo para essa nossa matéria: “Ele dá um tiro no escuro para acertar o alvo”.
Os grupos mais afetados são sem duvida as crianças e os idosos. Pacientes idosos que chegam a tomar entre dez a vinte comprimidos diariamente. E vocês devem conhecer pessoas assim polimedicadas, até mesmo na própria família, mas talvez nem tivessem despertado para essa grave questão que ora levantamos.
Sem aquelas disciplinas que ensinam o que são medicamentos, suas indicações, suas contraindicações, efeitos adversos, interações medicamentosas, farmacodinâmica e farmacocinética, informações inclusive obrigatórias nas bulas dos fármacos e as quais não são dadas as mínimas atenções, o medico não deveria nem receber o diploma, quanto mais se abrir novas escolas e aumentar as vagas nas já existentes.
Pedimos a Secretaria de Ensino Superior (SESU) do Ministério de Educação (MEC) que reflita sobre estas questões que ora expomos. Precisamos fazer uma reforma na grade curricular de todas as escolas de medicina do país, quiçá impondo a contratação de professores dessas áreas podendo até sermos nós, desde que estejamos verdadeiramente capacitados e preparados para ensinar os fundamentos da farmacologia clinica e terapeutica e alertar os futuros médicos para a importância do saber prescrever. Informamos que encaminhamos a Comissão de Ensino Medico do Conselho Federal de Medicina carta-proposta a este respeito e recebemos a resposta nos dando total apoio. Estamos dispostos a auxiliá-los com a nossa humilde colaboração.
*Marco Aurelio Smith Filgueiras é conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Estado da Paraíba (CRM-PB).