Escrito por Aloísio Tibiriçá Miranda
Voltamos, por sua relevância, ao tema do Sistema Único de Saúde, responsável direto pela assistência de 150 milhões de brasileiros, é também o maior mercado de trabalho, ao menos potencial, para os médicos.
Cantado em verso e prosa pelas suas propostas de ser, em tese, um sistema organizado e de acesso universal e gratuito, ele padece, na prática, da falta de prioridade de sucessivos governantes para sua real e definitiva implantação e fortalecimento.
Senão, vejamos. O sistema de planos de saúde, chamado suplementar, atende, somente, a 25% da população (46 milhões de pessoas) e, com isso, gasta 55% do valor total dos gastos com a saúde no Brasil. Com o nosso combalido SUS, gastam-se 45%. Vale salientar que a maioria dos países europeus, que garante o acesso a todos na saúde publica, tem cerca de 70 a 80% dos gastos públicos. Em nosso país, a simples votação no Congresso de uma regulamentação da Emenda 29, que traria mais recursos para o setor, se arrasta no rol das iniquidades da política nacional há mais de 10 anos.
Cresce o numero de usuários dos planos de saúde. Este aumento foi de 10% no ultimo ano. Alternativa para empresas e pessoas com poder aquisitivo, este setor se torna cada vez mais um parâmetro de assistência e sonho de consumo. Esse fenômeno, chamado recentemente por um ex-ministro de “americanização” da saúde, tem como resultado final uma economia de custos para o governo, que se desonera assim dos gastos com os que migram do SUS para os planos de saúde. Desfinanciamento do SUS e incentivo ao crescimento da saúde suplementar – será este um projeto em curso?
As repercussões deste quadro são sentidas diretamente pelos sinais e sintomas emitidos pela situação da assistência em saúde, revelados pela mídia, pela sociedade em geral e pelas entidades medicas.
Torna-se repetitiva a citação dos problemas, tais como: a superlotação e sobrecarga de trabalho nas emergências, falta de referencia e regulação, filas de espera, falta de profissionais e de perspectiva de carreira medica, salários defasados, contratos temporários, o que revela a falta de condições adequadas de trabalho e assistência.
Alguns dados do Rio de Janeiro, que tem a maior rede própria do Brasil, ajudam a ilustrar o panorama dos recursos humanos em todo o país.
Na ausência de concursos públicos com remuneração digna, cresce o numero de médicos com contrato temporário nas emergências. Nos hospitais federais são cerca de 50% do quadro. Nos estaduais cerca de 60% e de 50% nas emergências da prefeitura. Mesmo assim faltam 223 médicos para as emergências e UTIs federais e cerca de 90 médicos nas três das maiores emergências do município.
Os nossos colegas emitem sinais claros de descontentamento e partem para mobilizações em todo o país. Nós não só acompanhamos hoje pelo CFM esta situação, como também procuramos, através da Comissão Nacional Pró-SUS, canalizar esse inconformismo em ações nacionais articuladas que potencializem as nossas ações, que têm a força da justiça e da ética, e traduzem, certamente, os anseios dos médicos e as necessidades da nossa população.
Aloísio Tibiriçá Miranda é 2º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM) e coordenador da Comissão Nacional Pró-SUS – Remuneração e Mercado de Trabalho do Médico.