* Escrito por Claudio Tinoco Mesquita*
Com uma história de desafios e superação a medicina nuclear brasileira celebra 54 anos em 14 de setembro. Neste ano de 2015 a Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN) instituiu a data da fundação da entidade como celebrativa ao Médico Nuclear – sendo constituído “14 de setembro – Dia do Médico Nuclear”.
Desde a sua fundação, em 1961, a SBMN, entidade filiada à Associação Médica Brasileira (AMB), – tem buscado estratégias que fortaleçam e desenvolvam a especialidade no País, para que possa ser atingido o pleno potencial diagnóstico e terapêutico nos diversos campos da saúde.
Há aproximadamente 700 médicos nucleares no Brasil, segundo estimativa do levantamento “Demografia Médica no Brasil – Vol. 2”, do Conselho Federal de Medicina (CFM) e do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), atualizado com dados da SBMN, com base nos últimos concursos de título de especialista em medicina uclear, realizados em 2014 e 2015. Destes mais de 55% estão no Sudeste; mais de 20% Nordeste, aproximadamente 10% no Centro-Oeste; o restante no Norte. Em sua maioria, a especialidade é composta por médicos na faixa dos 30 e 60 anos; sendo os com idade inferior a este grupo ainda com baixa representatividade.
A medicina nuclear tem crescido em média 4,5% ao ano e esse número é maior que o do próprio País. Presente em 430 serviços de MN no Brasil, entre clínicas, hospitais, centros de pesquisa que atendem a mais de um e meio milhão de pessoas por ano. Nos últimos 20 anos – desde 1995 – mais de 30 milhões de procedimentos foram realizados no Brasil com segurança e qualidade, conforme dados da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN).
A especialidade apresenta hoje vasta empregabilidade no campo da medicina no mundo, mas infelizmente no Brasil ainda não se apresenta adequadamente empregada, pois há uma grande assimetria entre o uso na saúde suplementar (planos e operadoras de saúde) – cujo acesso é comparável aos níveis de outros países, e o acesso aos pacientes que dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS) – em que as taxas de utilização são muito inferiores às satisfatórias. Para amedicina nuclear, é preciso dobrar o número de serviços para 800 e de médicos nucleares, também – alcançando 1.400 especialistas, para assim atingir o padrão internacional mínimo.
Ainda é notório o desconhecimento não apenas da população, mas dos próprios colegas médicos. E isto se deve à fragilidade na abordagem da medicina nuclear no dia a dia da formação em medicina, de maneira geral, que ainda não faz parte do currículo como disciplina o que limita a possibilidade de contato/vivência com a especialidade.
Ao contrário de outros países, no Brasil, muito poucas faculdades de medicina dispõem da disciplina de medicina nuclear. Na grade científica da graduação em medicina a abordagem em medicina nuclear ainda é tímida, fator que contribui para o baixo interesse neste campo. Apesar da evolução expressiva da especialidade no País nos últimos anos, o Brasil ainda ocupa a 25ª posição de um ranking de quantidade de exames realizados por ano. Como exemplo, enquanto o Canadá executa 64,6 exames por mil habitantes/ano, o Brasil realiza apenas 2,5. Isso demonstra claramente a necessidade de se difundir a especialidade no país.
A medicina nuclear brasileira conta com 436 centros em operação, responsáveis pelo atendimento de mais de dois milhões de procedimentos a cada ano. Entretanto, é notória a subutilização da medicina nuclear pela população brasileira, em especial dos usuários do SUS.
Outro desafio à MN cabe à alta dependência de insumos importados – os radiofármacos – para sua subsistência. Precisamos deles assim como é necessário o combustível para o carro andar. Diversos são os motivos para a fragilidade da especialidade, destacando-se alta dependência do fornecimento de isótopos médicos produzidos pela CNEN, que detém o monopólio para a produção dos radioisótopos com meia-vida superior a duas horas; a ausência de reajuste das tabelas de remuneração de procedimentos de Medicina Nuclear pelo SUS desde 2009.
A maior parcela (82%) dos procedimentos ambulatoriais de medicina nuclear diagnóstica realizados pelo SUS são feitos na esfera privada, que precisa manter a sua sustentabilidade financeira. Ao SUS são fornecidos 23 radiofármacos, enquanto no Brasil há aproximadamente 40 radiofármacos. Fora isso, existem mais de 75 radiofármacos em uso clínico na Europa e Estados Unidos.
Há ainda a ausência de um plano coordenado de desenvolvimento da área médica nuclear, mesmo sendo possível observar iniciativas substanciais como o projeto do Reator Multipropósito Brasileiro e os Projetos de Desenvolvimentos de Novos Fármacos e Boas Práticas em Radiofarmácia desenvolvidos no IPEN.
Como podemos mudar este cenário? Por meio de um maior investimento no desenvolvimento e produção de radiofármacos no Brasil. Desenvolver novos radiofármacos e alcançar soberania na área de pesquisa e desenvolvimento são outros pontos a serem alcançados. Hoje o Brasil vai a reboque das coisas, temos de ter produção soberana.
O Dia do Médico Nuclear vem sedimentar um processo que temos há muito empreendido, em busca do reconhecimento da especialidade e de seu potencial no campo da medicina. Ainda há muito a se caminhar neste sentido, mas acreditamos estar no caminho certo para alcançarmos o reconhecimento, fortalecimento e expansão da especialidade, em suas diversas vertentes, seja na formação, desenvolvimento e, sobretudo, no atendimento à população.
* É médico nuclear e presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN).
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