Escrito por Antonio Carlos Lopes*
Unanimemente reconhecida como a melhor ferramenta de treinamento e formação de médicos especialistas, a residência médica está completando 30 anos. Há ótimos motivos para comemorar. Especialmente porque, no último triênio, foram registrados avanços importantes como a valorização da preceptoria e dos preceptores, além da criação de mecanismos para impedir a utilização do residente mão-de-obra barata, a adequação da duração dos vários programas das especialidades, assim como a criação de programas em novas áreas, como a Medicina do Esporte.
Resta, porém, um longo caminho a trilhar. Hoje, quando falamos de medicina e saúde, o principal problema do país é que as escolas médicas estão muito ruins. Existe um número excessivo de escolas e em boa parte delas os professores deveriam estar aprendendo, e não ensinando. Contudo, é fundamental registrar que a residência não é remédio para esse mal. Seu objetivo é formar especialistas e não assumir o papel das faculdades no processo de graduação.
Na Comissão Nacional de Residência Médica, trabalha-se com persistência e competência para implantar uma visão humanista a esse segmento, destronando o enfoque essencialmente tecnicista que prioriza exclusivamente aspectos tecnológicos da medicina. Lidamos com pessoas, sejam elas médicos ou pacientes, portanto, esse é o componente mais relevante a considerar a cada decisão.
Um exemplo: não podemos induzir os jovens médicos a escolher essa ou aquela especialidade. O certo é atuar no sentido de criar oportunidades e estimular honestamente a formação de especialistas em várias regiões do país, de forma a fixar os profissionais de medicina nos locais carentes destes médicos.
Atualmente ainda falta estrutura para manter programas de residência em vários locais do país. Faltam equipamentos e, fundamentalmente quem ensine. Realmente o pior é a falta de médicos competentes para atuar como preceptores. Sem o preceptor experiente não há programa de residência eficiente. É por isso, aliás, que os estudantes procuram os grandes centros. É por isso também que precisamos lutar muito pela valorização do preceptor, pois sem ele não há residência médica.
É necessário que se entenda que o ensino médico não é apenas um repasse de conhecimentos. O professor, o preceptor, precisa ser qualificado e estar ao lado de quem quer aprender, porque é a atitude do profissional experiente, sua relação com o paciente, que forma um médico mais humano e capaz de um diagnóstico correto.
De nada adiantam os recursos tecnológicos avançados sem a presença de um médico que ouça o paciente e saiba identificar a doença. Ao contrário, um médico bem formado resolve a maioria dos problemas sem a tecnologia avançada. Seguindo essa lógica, o residente deve saber tomar decisões, mas sempre sob a supervisão do preceptor, que precisa marcar presença, que deve ser a referência, o verdadeiro mestre, aquele que prepara seu pupilo para um voo preciso.
Justamente porque só se aprende medicina com o testemunho da presença, publicamos, em meados de 2005, a resolução que criou o intercâmbio interinstitucional e o estágio voluntário em regiões de difícil acesso. O primeiro permite que um jovem médico de regiões distantes ou fronteiriças possa fazer parte de sua residência numa instituição local e parte numa instituição mais tradicional, nos grandes centros, possibilitando a melhoria progressiva dos programas de residência dessas localidades.
Com o estágio voluntário o médico pode passar de 30 a 60 dias prestando serviços em regiões carentes, para ficar sensibilizado em relação aos problemas sociais. Achamos que falta essa visão social ao médico formado e avaliamos que esse estágio trará uma influência especialmente interessante para suas carreiras.
Na comemoração de seus 30 anos, a residência médica deve persistir nessa linha. Humanização, responsabilidade social e compromisso com os pacientes são os pontos que têm de nortear sempre a ação de todos os médicos e especialistas.
* É secretário executivo da Comissão Nacional de Residência Médica do MEC e professor titular da Disciplina de Clínica Médica da Unifesp.
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