Escrito por Carlos Vital Tavares Corrêa Lima*
Neste 7 de abril, quando se comemora o Dia Mundial da Saúde, a qualidade da assistência oferecida aos brasileiros merece ser tema de extensos debates e profundas reflexões. Está em pauta a sobrevivência de um modelo de atenção considerado referência do ponto de vista teórico, mas que ao longo de sua existência enfrenta uma série de percalços, com impacto sobre os pacientes, os médicos e demais profissionais da área da saúde.
Em 2018, o Sistema Único de Saúde (SUS), um dos maiores do mundo, completa 30 anos.
Sem dúvida, trata-se de uma das maiores conquistas do povo brasileiro na área social, referendada pela Carta Magna de 1988.
É inegável que o SUS acumula importantes resultados! No Brasil, um País marcado pela desigualdade social, esse Sistema consegue marcas impressionantes, como a realização, por ano, de mais de 1,5 milhão de cirurgias eletivas; de 12 bilhões de internações; e 4,2 bilhões de procedimentos ambulatoriais.
Além disso, o SUS determinou a implementação de Programas Nacionais, como o de Imunização (PNI), responsável por 98% da distribuição de vacinas do País; e o de Transplantes, que responde por mais de 90% dessas cirurgias no território nacional.
Entre 2010 e 2016, houve aumento de 19% no número geral de transplantes, com destaque para os de coração (aumento de 114%, passando de 167 para 357); rim (aumento de 18%, passando de 4.660 para 5.492 transplantes); fígado (aumento de 34%, passando de 1.404 para 1.880); medula óssea (crescimento de 39%, saltando de 1.695 para 2.362); e pulmão (crescimento de 53%, passando de 60 para 92).
Apesar dos avanços, o SUS convive com enormes dificuldades que comprometem seus resultados. Talvez as principais sejam o subfinanciamento e a má gestão dos recursos disponíveis. Dados apurados pela organização Contas Abertas, a pedido do Conselho Federal de Medicina (CFM), mostram que cerca de R$ 174 bilhões deixaram de ser aplicados pelo Ministério da Saúde entre os anos de 2003 e 2017.
Esse montante representa 11% do total autorizado para o Ministério da Saúde no Orçamento Geral da União (OGU)
durante aquele período (cerca de R$ 1,6 trilhão). Ressalte-se que quase metade dos recursos não utilizados deveria ter sido investida na realização de obras e compra de equipamentos médico-hospitalares para atender o SUS.
Em consequência, o impacto do mau uso das verbas disponíveis repercute no sucateamento da infraestrutura. Por exemplo, quase 24 mil leitos de internação de pacientes que precisam permanecer num hospital por mais de 24 horas foram desativados na rede pública de saúde desde dezembro de 2010. Isso representa uma diminuição de 13 leitos por dia!
Dentre as especialidades mais afetadas em nível nacional, estão a psiquiatria, a pediatria cirúrgica, a obstetrícia e a cirurgia geral.
A esse problema se somam inúmeros relatos de pacientes e profissionais, assim como de notícias publicadas pela imprensa ou de denúncias de órgãos de controle e fiscalização, que dão conta de falta de insumos, medicamentos e da falta de acesso tempestivo a consultas e exames. O quadro delineado revela a face negligenciada do SUS, que, sem a adoção de medidas efetivas, continuará provocando atrasos em diagnósticos e em inícios de tratamento. Ao final, são prejudicados mais de 160 milhões de brasileiros que dependem exclusivamente da rede pública. Porém, o SUS permanece como um patrimônio nacional, que exige um empenho de todos os brasileiros em defesa de sua existência e eficiência.
No momento em que o SUS completa 30 anos, é preciso encontrar soluções eficazes que permitam ao Sistema Único de Saúde a consecução de plenos resultados, com decorrente respeito aos direitos humanos em um futuro melhor, de assistência à saúde com qualidade para todos os brasileiros.
* É presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).
Palavra do Presidente publicada na edição nº 277 do jornal Medicina. Acesse aqui a edição.