Hermann Alexandre Vivacqua von Tiesenhausen*
Além do conturbado cenário político que abala o País, no qual sucessivos lances surpreendem a sociedade pela riqueza de detalhes ou pelas mirabolantes estratégias adotadas pelos agentes envolvidos, a cada dia se fortalecem os sinais de que os indicadores econômicos também sofrem a consequência desses e outros reveses.
Em 2015, a economia brasileira encolheu 3,8%. Foi o pior resultado desde 1996, quando esse levantamento começou o ser realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esse número é o corolário de uma série de sintomas que colocam o País em estado de alerta.
A inflação, que durante décadas foi o pesadelo de milhões de famílias, voltou a rugir forte novamente. No ano passado, o dado oficial fechou em 10,67%, muito acima do limite da meta do governo, assumindo o topo do ranking no período iniciado em 2002, quando o índice foi de 12,53%.
O aumento do desemprego também preocupa economistas e pais de família. Os últimos índices falam em 6,8% de brasileiros sem trabalho, percentual maior que o de 2014 (4,8%) e que só é superado pelos números de 2003. A lógica indica que o fechamento das vagas deve gerar diminuição de renda e abandono da escola pelos mais jovens para colaborar com a sobrevivência familiar, entre outros fatores.
Não bastassem esses sinais que ecoam forte, não se pode ignorar a velocidade de crescimento da dívida pública, que encerrou dezembro no patamar recorde de 66,2% do PIB. O governo não tem conseguido controlar seus gastos. Em 2015, ele gastou R$ 111,2 bilhões a mais do que arrecadou.
Até o momento, as possibilidades de recuperação imediata são pífias, sendo que a gestão ineficiente não ajuda a melhorar o quadro sistêmico de crise econômica. Um exemplo foi o envio ao Congresso Nacional pelo governo de uma proposta orçamentária com um rombo de R$ 30 bilhões.
A manobra irresponsável, com consequências graves para áreas como educação e saúde, foi uma prova explícita do “excesso de confiança” de uma equipe que agora vê crescerem as dificuldades de que a ideia prospere.
Com a fragilização da base de apoio do governo e a resistência crescente de importantes setores produtivos, diminui o clima pró-retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), deixando em seu lugar a expectativa de novos e profundos cortes para manter a máquina pública funcionando.
Diante desse quadro tão sombrio, que deve agudizar a insatisfação dos brasileiros com a qualidade dos serviços oferecidos pelo Estado, como tem ocorrido ao longo das últimas décadas com o Sistema Único de Saúde (SUS), o mínimo a fazer é conclamar indivíduos e instituições a defenderem a ética, a justiça e o fim da corrupção.
Independentemente de partidos e ideologias, a sociedade brasileira deixa claro que não suporta mais os abusos e exige o estabelecimento de uma nova ordem orientada pela legalidade e pela moralidade, pressupostos do Estado Democrático de Direito.
É essa nação forte que esperamos ver surgir desse momento turbulento nas esferas social, econômica e política, que pode se configurar como um divisor de águas na relação entre os cidadãos, a classe política e o Estado. É preciso consolidar o princípio jurídico e republicano de que ninguém está acima da lei nem deve se beneficiar de subterfúgios para se colocar fora de seu alcance.
O Brasil não quer ser somente o país do futuro. Ele é o resultado de nossa herança acumulada através dos séculos e das decisões tomadas no presente. Cabe àqueles comprometidos com a reconstrução do País empenhar-se para que a ordem jurídica determinada na Carta Magna de 1988 prevaleça e nos leve a um novo tempo, no qual o Estado não seja de poucos, mas de todos nós.
*Primeiro-secretário do Conselho Federal de Medicina (CFM).
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