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Escrito por Rosylane Nascimento das Mercês Rocha*

A Campanha do ‘Setembro Amarelo’ ratifica a importância de trazer para o debate as ações e as política públicas voltadas à prevenção do suicídio. Números crescentes e estarrecedores chamam atenção para o aumento de 60% dos casos  nos últimos 45 anos, segundo a OMS.  No mundo, por ano, são cerca de 1 milhão de pessoas que se suicidam. No Brasil, o suicídio figura como 3a causa de morte violenta, sendo 12 mil ao ano com taxa elevada em 25% entre os jovens de 15 a 24 anos. A doença mental está presente na maioria dos casos e 90% dos desfechos trágicos teriam sido evitados se tivessem recebido ajuda e tratamento especializado.

Estarrecido o mundo acordou no dia 27 de março com a notícia de que o copiloto Andreas Lubitz teria jogado o Airbus 320 da Germanwings contra as montanhas dos Alpes franceses em decorrência de suposta crise de depressão, matando a si próprio e mais 149 pessoas.

Os principais jornais noticiaram que o jovem copiloto de 27 anos sofreu um surto depressivo, com diagnóstico que até então não foi confirmado por nenhum médico. A forma com que foram tratados, o evento e as suposições, apenas provocou uma onda de revolta, medo, interpretações distorcidas e exalta o estigma, o preconceito e a discriminação.

Há algumas décadas tem se trabalhado pelo fim do estigma, trazendo à baila questões importantes acerca da inclusão social dos doentes com transtornos mentais e comportamentais (TMCs). À luz da ciência médica, são doenças que se submetidas ao tratamento especializado, permitem ao paciente o convívio pleno na sociedade com o desenvolvimento das suas potencialidades nos diversos campos do saber, do lazer e do trabalho.

É histórico o preconceito sofrido pelos pacientes, seja por ele próprio, pela família, pelos pares e por toda a sociedade, de todas as formas e matizes. É interesse absoluto da Medicina exterminar este tipo de estigma. Prejudica o diagnóstico preventivo, o tratamento e culmina de forma trágica com a interrupção da vida de milhares de pessoas acometidas.

E podemos ouvir com a notícia: “Por que ele estava trabalhando com depressão?”

Em muitas ocasiões os pacientes em curso de transtorno mental não precisam se afastar do trabalho, ao contrário do que a maioria das pessoas pensam. O trabalho não é apenas um meio de garantir a subsistência do indivíduo e de sua família, mas, de fato elemento fundante do homem. É meio de realização pessoal, de elevação da autoestima, de reconhecimento dos pares, de sentido de utilidade à sociedade, enfim, meio de desenvolvimento de suas potencialidades, e não como outrora difundido, meio de tortura do indivíduo. Ao menos não, em sua essência. Por outro lado, quando o trabalho se apresenta como fator de adoecimento, desencadeamento ou agravamento de um transtorno mental, então se faz necessário o afastamento da atividade laboral.

Nas duas situações, o médico do trabalho, como gestor em segurança e saúde no trabalho, reúne todas as ferramentas necessárias à identificação da doença, do risco e da conduta a ser seguida. Ainda que os TMCs não sejam de fácil diagnóstico, os médicos do trabalho têm, cada vez mais, aprofundado os estudos sobre esta área da medicina e, certamente em conjunto com o médico psiquiatra assistente do trabalhador, poderá definir a melhor conduta para cada caso. No Brasil e no mundo, os TMCs figuram entre as principais causas de afastamento do trabalho sendo o mais alto índice de absenteísmo, ou seja, o que deixa o trabalhador por mais tempo afastado. Na empresa, programas de prevenção em saúde mental, palestras e campanhas educativas com envolvimento de empregados e empregadores têm resultados exitosos quando inseridos na cultura empresarial e com acesso aos serviços públicos e/ou privados de assistência ao doente com TMCs.

Dados do Ministério da Saúde evidenciam que 46 milhões de brasileiros sofrem de depressão, 700 milhões no mundo, aponta a Organização Mundial de Saúde; sendo que 1/3 desses não tem acompanhamento médico especializado. Os TMCs  figuram como 13% de todas as doenças no mundo. A OMS ainda prevê que 350 milhões de indivíduos deverão sofrer de depressão e 90 milhões terão um surto em decorrência de dependência química, o que aponta que se os atuais números de suicídio são assustadores, se reconhecermos que são subnotificados, a realidade é que aumentará muito ainda.

E do que precisamos então?

Precisamos trazer para o debate, combater o estigma e prioritariamente, adotar políticas públicas de saúde mental eficazes.
 

* É médica do trabalho e conselheira federal de Medicina.

 

 
    

* As opiniões, comentários e abordagens incluidas nos artigos publicados nesta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do Conselho Federal de Medicina (CFM).

 

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