A expectativa é de que essas esferas judicantes e de controle freiem os desmandos e recoloquem nos trilhos a gestão da saúde pública do país. É inadmissível assistir setores do governo usarem o legítimo direito de a população receber tratamento digno como desculpa para levar adiante um projeto eivado de interesses privados (pessoais ou políticos), em detrimento de uma efetiva estruturação da assistência.
Faz-se importante ressaltar que não somos contrários à ampliação do acesso da população ao atendimento médico. Pelo contrário, a Constituição é clara: saúde é um direito de todos. Contudo, o Estado precisa cumprir o dever que lhe cabe de maneira consequente, com soluções permanentes. As lições do passado mostram que, no Brasil, o imediato e o midiático das ações governamentais passam, deixando para trás apenas frustração. Fugir dessa armadilha exige ousadia, visão de longo prazo e vontade política.
Há custos crescentes implicados na oferta de tecnologia para diagnósticos, tratamento adequado e custeio de profissionais. Trata-se de uma conta difícil de fechar, mas o governo precisa vê-la como retorno à sociedade de tudo o que leva em impostos e promessas. Afinal, o que é mais importante: superávits da balança comercial ou um povo bem tratado? É preciso usar o disponível com competência, o que a análise da execução dos últimos 12 orçamentos federais confirma não ser comum entre os gestores do SUS. Afinal, não é à toa que neste período o equivalente a R$ 94 bilhões não foram gastos. O pior é que cerca de R$ 40 bilhões estavam destinados para investimentos (reformas, construção de unidades, compra de equipamentos etc.). Poderíamos alinhavar uma infinidade de questões que estão em aberto, é o caso da posição do Ministério da Saúde ante o fechamento de 25 mil leitos desde 2005. Nos últimos três anos e meio, estima-se que o deficit foi de 13 mil. Para os gestores, essa afronta reflete tendência internacional da atenção primária. Quem conhece os hospitais sabe que teoria e prática não dialogam. O CFM não aceita que a conta dessa crise recaia sobre o paciente. Também repudia que a culpa da incompetência seja atirada sobre os médicos, num processo simplista de transferência de responsabilidade. A mera presença de um profissional num posto não prova a prioridade dada à saúde e nem dá à sociedade a assistência que tem direito.
É preciso que a gestão acorde e retire o Brasil desse pesadelo. A Justiça pode dar o sacolejo necessário nos gestores e os conselhos de medicina continuarão a prestar sua contribuição, levantando dados e apontando dados e equívocos.
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