Escrito por Ricardo Paiva
A epidemia de uso de crack que se apresenta no Brasil preocupa a todos os brasileiros. A presidente da República já se manifestou a declarar guerra ou enfrentamento a essa grande mazela social.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) criou uma Comissão de Assuntos Sociais que já realizou dois dos três seminários previstos. O primeiro, em novembro do ano passado, contou com a presença importante da coordenadora da SENAD; do Ministério da Saúde; diversos conselhos e sindicatos de profissionais de saúde; juristas; promotores e representantes da mídia, com foco sobre os dados epidemiológicos, o plano de enfrentamento do SENAD e a deliberação de construir diretrizes para o tratamento integrado aos usuários de crack (que foi objeto do segundo seminário) e um protocolo de capacitação para os médicos da rede pública de urgência, assistência básica e psiquiatras (que será o tema do terceiro seminário em julho de 2011).
Também a comissão realizou estudos tendo por base:
a) apresentação pela SENAD do Plano de Enfrentamento ao Crack do Governo Federal);
b) orçamento previsto e executado em 2010 para essas ações;
c) relatório da ONU sobre drogas em 2010;
d) proposta da OMS de fluxograma para atendimento aos usuários;
e) experiências europeia e americana nos últimos dez anos, disponibilizados na WEB.
De forma objetiva e legitimada não apenas dentro da comissão do CFM, mas consensuada nos dois seminários temos a considerar:
1 – O plano de enfrentamento proposto pela SENAD contempla toda as ações necessárias se implementadas obviamente;
2 – O recurso anunciado de 400 milhões para ações nas esferas policiais, saúde e sociais são insuficientes;
3 – Na execução de 2010, conforme disponibilizado no site do governo federal, foi autorizado apenas 90 milhões e gastos efetivamente 5 milhões o que aponta para a necessidade de ser revista a estratégia;
4 – Há um consenso sobre a eficácia para o enfrentamento que o Governo Federal nomeie um coordenador geral, com autoridade para que todos os ministérios venham a agir de forma integrada e que os recursos não privilegiem ações policiais ou de saúde em detrimento de ações sociais. Dessa forma estaria implícito que não funcionaria como no momento onde municípios pelo edital apresentam projetos isolados em cada uma das três áreas e os estados não podem apresentar posto que conforme o representante da SENAD, dr. Bertolote, o edital habilita apenas os municípios. Ainda sobre essa questão é imprescindível que haja determinação de metas, com responsáveis e prazos, controle e avaliação;
5 – Como sugestão da comissão, apresentamos três prioridades de cada um dos três eixos:
Eixo Policial
a) Ações de inteligência para reprimir a entrada da droga e mapear os pontos principais de venda;
b) Ação de inteligência para extirpar dos quadros policiais, profissionais envolvidos com o tráfico ou venda;
c) Ação de capacitação e qualificação das forças policiais nas relações humanas e inter-pessoais.
Eixo Saúde
a) Estruturar e capacitar as portas de entrada para o usuário (ESF, urgências), bem como implementar a rede de sustentação (CAPS, CAPS AD, hospitais de apoio, grupos de auto-ajuda e comunidades terapêuticas);
b) Dimensionar o número de profissionais médicos, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais para trabalharem em rede e de forma integrada;
c) Criar o agente comunitário social e alocá-lo nos ESFs até que a estrutura do Consuas esteja plenamente instalada.
Eixo Social
a) Criar centro de convivência em cada comunidade de periferia com biblioteca, espaço de arte, lazer e cultura;
b) Melhorar a qualidade das escolas para aprendizado em tempo integral e com formação profissionalizante;
c) Determinar que o Sebrae organize processo de economia solidária (banco popular com acesso a microcréditos) e cooperativas de trabalho conforme vocação economica das comunidades.
6 – A estimativa da OMS para o Brasil é que existam 3% de usuários o que implicaria em 6 milhões de brasileiros;
7 – O Ministério da Saúde trabalha com 2 milhões de usuários e estudo da Unifesp patrocinado pela SENAD demonstra que um terço dos usuários encontram a cura, outro terço cronifica o uso e outro terço morre e em 85% dos casos relacionado a violência;
8 – Não existe ainda uma droga específica. Os psiquiatras preconizam internação para desintoxicação de cerca de 7 a 14 dias, drogas usadas comumente como opióides e tratamento das co-morbidades são o passo inicial devendo o paciente ter acesso à rede de tratamento ambulatorial bem como aos processos integrados;
9 – É preciso mobilizar toda a sociedade civil (sindicatos, conselhos, movimentos sociais, movimento religioso, movimento estudantil), meio empresarial para criar uma consciência de responsabilidade compartilhada para o sucesso dessa grande ação de cidadania;
10 – As entidades médicas (Conselho Federal de Medicina, Federação Nacional dos Médicos e Associação Médica Brasileira) se disponibilizam para fazer parte dessa grande causa.
Ricardo Paiva é diretor do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco, membro da Comissão de Ações Sociais do Conselho Federal de Medicina e da ONG Humanos Direitos (Mhud)
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