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Escrito por Abdon Murad*

Tramita na Câmara de Deputados, em Brasília, mais precisamente na Comissão de Seguridade Social e Família, o Projeto de Lei 840/03, do deputado Elimar Damasceno (Prona-SP), que propõe instituir no Brasil o Exame de Ordem para médicos recém-formados, o que ficaria a cargo dos Conselhos Regionais de Medicina.

Há muito tempo posiciono-me contra esse projeto, pois, na minha ótica, ele tenta tratar o efeito e não as causas de um grande problema. O efeito são médicos mal formados, a grande maioria oriunda de escolas médicas particulares. Uma das causa, entre outras, é o abusivo e exagerado número de faculdades de medicina existente no nosso País.

Num total de 121, a maioria sem condições técnicas de preparar pessoas para cuidarem de outras, essas faculdades formam doze mil médicos por ano. O Brasil não necessita de mais médicos atualmente, pois já ultrapassou a relação médico/habitantes recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que é de um médico para cada grupo de 1000 habitantes.Nossa relação é de 1/700. Esses médicos estão mal distribuídos geograficamente, por falta de condições de trabalho e por péssima remuneração na maioria dos interiores brasileiros, o que provoca concentração nas grandes cidades, principalmente, no Sudeste e no Sul.

Além do exagerado número de escolas, a falta de Residência Médica piora o quadro, pois, a Residência é o melhor, se não o único, meio seguro de preparar especialistas em Medicina. É preocupante saber que apenas 60% dos médicos recém-formados no Brasil conseguem vagas em Residências Médicas, por falta de compromisso de muitas faculdades que se limitam a diplomar os médicos, sem garantir-lhes o imprescindível complemento da aprendizagem.

Existe um outro Projeto de Lei, número 65/03, do também deputado federal Arlindo Chinaglia (PT-SP), que tenta proibir por dez anos a abertura de novas escolas médicas. Este PL não está em efervescência como o que citei anteriormente. Como pode ser visto em rápidas pinceladas, o PL 840/03, que tenta determinar quem vai ser médico ou não neste País, se aprovado, não resolverá o problema. É necessário que se lute pela não abertura de novas escolas médicas e, mais ainda, pelo fechamento das que não deveriam existir, por falta de condições técnicas na formação e por não garantirem o aperfeiçoamento profissional dos novos médicos, através de vagas em Residências. Este é o caminho seguro, lógico, legítimo, respeitoso, ético e humanizado.

Não posso defender que o Exame de Ordem, uma espécie de passaporte para o exercício da Medicina, venha a ser implantado em nosso País, pois ele pretende atacar apenas a causa, que é o médico mal formado, mas fecha os olhos para a terrível permissividade da abertura e manutenção de novos cursos médicos de péssimo padrão e que não têm responsabilidade com a formação pós-gradual, através do oferecimento de vagas em Residências Médicas.

Sou visceralmente contra o já comentado Projeto de Lei, pois, se o mesmo for aprovado, este País validará e estimulará a abertura e a manutenção de péssimos cursos médicos e prejudicará os jovens que não têm culpa de serem atraídos pelo canto da sereia de mal estruturados, mal intencionados e permitidos cursos. Esses jovens, esperançosos de serem médicos, ingressam nas péssimas faculdades, concluem seus cursos, não encontram vagas em Residências Médicas e aí, seriam submetidos a uma prova, o pretendido Exame de Ordem, que poderia lhes proibir o exercício da Medicina, profissão para a qual, por longos seis anos e à custa de muito dinheiro e sacrifício, pensaram estar se preparando.

Não pode haver maldade maior do que essa, principalmente, se nos lembrarmos de que não existem bacharéis em Medicina. Ou se é médico, ou não se é nada e, assim, ficariam jogados fora o sonho, o tempo, a juventude, o dinheiro gasto e a paixão alimentada de ser médico.

 

*Abdon Murad é presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Maranhão (CRM-MA)


* As opiniões, comentários e abordagens incluidas nos artigos publicados nesta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do Conselho Federal de Medicina (CFM).


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