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Escrito por José Hiran da Silva Gallo*

Maus colegas são ervas daninhas que existem em todas as profissões. Geralmente, um mau médico em relação a seus pacientes é também mau colega. Questão de índole. A incompetência convive melhor com esses desvios de comportamento do que a boa formação científica. Ao tempo em que a boa formação ética, de modo ainda mais enfático, rejeita essa atitude deletéria de tais parasitas classistas de alta patogenicidade.

Os motivos que levam esses indivíduos a agir de modo dissonante em relação a seus colegas são diversos. O erro essencial de caráter, sem dúvida, é a raiz da questão. Ao invés de imitarem os bem-sucedidos na profissão e na vida, preferem montar armadilhas ao longo do caminho para que caiam em uma delas e, de preferência, não mais se levantem. A maledicência é sua arma mais insidiosa e letal. Com ou sem motivo, vivem a disseminar a discórdia e a difamação. Quando têm oportunidade de fazer isto sob as luzes dos refletores da mídia, posam de vestais, donos de todo o saber, de toda a verdade, de toda a moralidade.

Um fator exacerbador de tais atitudes deletérias é a ascensão desses maus médicos ao poder. O desequilíbrio emocional provocado pelo cargo de chefia, a síndrome popularmente conhecida como «chefite», vem acarretar nesses indivíduos uma compulsão que libera impulsos de um frenesi incontido. O deslumbramento é tal que os embriaga a razão e os torna réus da própria vaidade. Esses colegas, historicamente, têm dirigido ações ofensivas contra os interesses dos médicos – quando não se escondem no silêncio conivente próprio dos covardes. Uma impetuosa má conduta acomete esses pseudocolegas tão logo assumem um cargo, ainda que de pouca relevância. Desfilam ordens cerceadoras de nossa liberdade profissional, agressoras às nossas idoneidade e competência, acintosamente perpetradas através de insistentes e irresponsáveis documentos. Quando não, arquitetam, nos bastidores, conspirações contra aqueles que, por vezes, têm como únicos obstáculos para a convivência com esses tais a competência e a sinceridade. Avessos a críticas, ainda que construtivas, preferem os bajuladores, os subservientes.

Que propósitos levariam tais colegas a atitudes tão deploráveis? Os algozes da classe médica respondem ter compromisso de lealdade e fidelidade com seus patrões. Mentira! Sabemos que renegam os interesses de seus empregadores porque, na maioria das vezes, recebem salários vis. Mesmo assim, optam por agredir aqueles que por bom-senso e ética deveriam defender.

Obviamente, não faço aqui a apologia do corporativismo incondicional. O que prego é a observância aos princípios éticos que norteiam nossa conduta profissional. Médico que conspira levianamente contra seus colegas de classe não é digno dela, principalmente em se tratando da nossa, que sofre todo tipo de preconceito e pressão social. Exigem-nos o sacerdócio, mas não respeitam nossos direitos de cidadãos, de seres humanos que somos. Confunde-se, dolosamente, esse alardeado sacerdócio com voto de pobreza, com submissão ao caprichos reprováveis de pacientes e seus afins. Sacerdócio sim, mas no sentido de atendermos com denodo àqueles a quem assistimos, colocando nossa ciência e virtudes humanitárias em favor de sua recuperação. «Ser médico, no entender do doente, significa ser sempre jovial, educado, paciente, resignado, abnegado e até ter, às vezes, obrigação de trabalhar de graça, a qualquer tempo, de dia ou de noite. Os pacientes exigem perfeição a qualquer custo, e mesmo os deslizes humanamente possíveis, infelizmente, são imperdoáveis e coexistem a alguns milímetros da difamação», ensina Ubirajara Dutra Garcia. A sociedade quer ser bem tratada pelo médico, mas não o trata na mesma proporção. É o tributo que, lamentavelmente, temos de pagar por termos escolhido uma profissão que convive com seu semelhante na fronteira entre o amor e a rejeição, a afeição e o ódio. Isto acontece porque o ser humano é refratário a todo poder que a ele se impõe. O poder científico da cura submete as pessoas à decisão médica num momento da vida em que se encontram mais fragilizados.

Como se não bastasse todo esse fogo cruzado, por vezes ainda temos que aturar esses colegas malformados a atear a fogueira que nos ameaça permanentemente.

Definitivamente, ele precisam ter a consciência de que macular a imagem do médico não prejudica somente ao médico atingido diretamente mas, por extensão, a toda uma classe, a todos os que dele necessitam por motivo de doença. «Com enorme freqüência ouço médicos pichando colegas somente porque não concordam com os enfoques alheios. Ouvir um profissional arrasar outro pode ser tremendamente desmoralizante para o paciente. O feitiço pode virar contra o feiticeiro, e minar a confiança no médico acusador, além de diminuir o respeito a uma profissão que, mais do que a maioria das outras, depende da confiança para funcionar com eficácia. Em última análise, a crítica ferina corrompe a capacidade de cura dos médicos», admoesta Bernard Lown. Por isso, tais falsos colegas, traidores dos ideais hipocráticos, devem merecer veemente repúdio, objetivas reações saneadoras e justas penalidades no âmbito dos conselhos de ética e da justiça comum.

O Código de Ética Médica, em seu artigo 19, postula a boa convivência: «O médico dever ter, para com os seus colegas, respeito, consideração e solidariedade, sem, todavia, eximir-se de denunciar atos que contrariem os postulados éticos à Comissão de Ética da instituição em que exerce seu trabalho profissional e, se necessário, ao Conselho Regional de Medicina».

O momento, portanto, é de reflexão para todos nós. Ou tomamos providências contra esses elementos lesivos à classe ou teremos que dar respostas à nossa consciência profissional pelo estado letárgico e permissivista que assumimos. A imagem do médico já está muito dilacerada, dispensa a «colaboração» danosa desses tipos. Ou eles reavaliam suas posições e se corrigem ou teremos que corporificar forças para extirpá-los de nosso meio, tais como cânceres que são, condenando-os à repulsa e ao alijamento.

 

* É vice-presidente do Conselho Regional de Medicina de Rondônia (Cremero) e conselheiro do Conselho Federal de Medicina.

* As opiniões, comentários e abordagens incluidas nos artigos publicados nesta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do Conselho Federal de Medicina (CFM).


 * Os textos para esta seção devem ser enviados para o e-mail imprensa@portalmedico.org.br, acompanhados de uma foto em pose formal, breve currículo do autor com seus dados de contato. Os artigos devem conter de 3000 a 5000 caracteres com espaço e título com, no máximo, 60.


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